São Paulo, segunda-feira, 19 de setembro de 1994
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Vengerov demonstra evolução em seu estilo

ARTHUR NESTROVSKI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Se há uma coisa que não falta no mundo no hoje são bons violinistas. Dos veteranos (Isaac Stern, Milstein) à geração intermediária (Perlman, Mintz, Kremer) aos jovens (Salerno-Sonnenberg, Kennedy) e até às crianças (Midori), é impressionante a quantidade de grandes solistas.
As chances de conquistar um lugar nesta companhia são proporcionalmente mínimas; mas desde sua vitória no concurso Carl Flesch de Londres, em 1990, aos 16 anos, o russo Maxim Vengerov admitiu-se a si mesmo no Olimpo.
Vengerov é o Yevgeny Kissin do violino e, como seu compatriota pianista, já tem um lugar garantido entre os maiores intérpretes da sua geração.
Há uma diferença importante, porém, entre Vengerov e Kissin, como entre Vengerov e virtualmente todos os grandes violinistas mais jovens que Perlman. Quem conhece as escolas de música norte-americanas sabe que o adjetivo "agressivo" se transformou, hoje, num elogio: "Ele é agressivo para tocar" é uma indicação de virtude.
O estilo americano –expansivo, de som grande, mas anguloso, com ataque firme e preocupações formais– vem se tornando a língua franca da interpretação, especialmente do repertório romântico.
Numa gravação de 1990, recém-editada pela Canyon Classics, em que Vengerov toca a "Sonata em dó menor" de Beethoven e a "Chacona" de Bach, entre outras peças, ele se revela um músico esplendidamente seguro de si e cheio de imaginação, mas ainda tocando de maneira próxima a essa média americana. Que ninguém compreenda mal: é a melhor gravação em catálogo da "Sonata" de Beethoven.
Mas que diferença quando se ouve o CD com os concertos de Bruch e Mendelssohn, distribuído no Brasil aproveitando a vinda de Vengerov com a Orquestra do Concertgebouw. Se antes Vengerov lembrava um pouco Perlman, agora está noutra esfera, fazendo pensar em David Oistrakh e, acima de tudo, em Jascha Heifetz.
Foi-se o estilo "americano": Vengerov toca, por assim dizer, modestamente, com simplicidade, com uma fluência natural e dedicação plena aos detalhes. Músicos desse calibre criam a ilusão de que tudo é fácil, de que tocar violino como Vengerov é apenas uma questão de se concentrar, de prestar atenção, como quem toma um copo de água no escuro.
Duas palavras sobre o repertório. O "Concerto" de Mendelssohn é uma daquelas coisas raras: uma obra perfeita, como a "Ode ao Outono" de Keats, ou as valsas de Chopin.
Sobre Bruch, vale a pena lembrar a tirada do próprio compositor, atormentado pelo sucesso abusivo do "Concerto": "Tendo vindo à tona, recentemente, o fato espantoso de que os violinos do mundo estão tocando o 'Concerto de Bruch' por conta própria, fica essa obra, a partir de agora, irrevogavelmente banida, para descanso de nossas pobres almas". Talvez se devesse, ao menos neste caso, respeitar a vontade do compositor.

Disco: Concertos para Violino e Orquestra, de Max Bruch (op. 26) e Mendelssohn (op. 64)
Artista: Gewandhausorchester Leipzig (regência de Kurt Masur) e Maxim Vengerov (violino)
Lançamento: Teldec (importado)
Quanto: R$ 27 (em média)

Disco: Carmen Fantasy - obras de Beethoven, Schubert, Bach e Bizet
Artista: Irina Vinogradova (piano) e Maxim Vengerov (violino)
Lançamento: Canyon Classics (importado)
Quanto: R$ 24 (em média)

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