São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 1994
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O PT e a síndrome do escorpião

LUÍS NASSIF

Caso queira permanecer como partido estruturado, depois das eleições, o PT precisa urgentemente analisar seus erros e rever sua postura em relação ao país.
Não se pode obviamente diminuir o papel do Real nessas eleições. Mas o PT de Lula começou a cavar sua sepultura antes mesmo da troca de moedas.
Enquanto representava a possibilidade de ruptura desse modelo de apropriação política do Estado, Lula acumulou mais de 40% nas pesquisas.
O PT dispunha de excelentes trunfos para consolidar essa imagem. Nos últimos anos, prefeitos petistas promoveram verdadeira revolução na maneira de administrar municípios.
Alguns foram bem sucedidos, outros esbarraram na inexperiência e no boicote das corporações. Mas muito deles ousaram romper com as formas convencionais de gestão, estabelecendo modelos mais transparentes de tratar com dinheiro público.
A partir de prefeituras petistas, o orçamento participativo passa a ser um novo paradigma de gestão pública. Graças à independência em relação a interesses econômicos e de empreiteiras, muitas prefeituras petistas lograram avançar em terceirizações e privatizações de maneira mais profunda que muitos liberais de rabo preso.
No plano federal, alguns dos parlamentares do partido converteram-se em arautos respeitabilíssimos da cidadania.
Debaixo do tapete
Todo esse arsenal de argumentos, que seria fundamental para consolidar a candidatura Lula, foi varrido para debaixo do tapete porque não interessava politicamente aos grupos que controlam o partido, que perderiam espaço interno para setores mais modernos.
Na base, o PT é evangélico, passional, facilmente ludibriável pelos populistas de plantão. No meio campo, dispõe de cidadãos consequentes, mas sem espaço de atuação. No topo, de dirigentes que ascenderam manipulando as bases e que passam a instrumentalizar o partido em seu próprio benefício. No fundo, o PT é muito parecido com o Brasil.
Tem saltado aos olhos campanhas de dirigentes do partido, eleitoralmente inexpressivos, com gastos muito acima da média partidária. Não será coincidência se o financiamento provir de corporações estatais anacrônicas. O partido pagou a conta de ter substituído o discurso da cidadania pelo do corporativismo. Mas os dirigentes garantiram o seu.
No fundo, as práticas políticas internas do PT são filhas diretas da mesma estrutura mental que gerou coronéis nordestinos e toda a tradição corporativista brasileira.

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