São Paulo, quinta-feira, 22 de setembro de 1994
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General americano faz elogios a Cedras

CLAUDIO JULIO TOGNOLLI
ENVIADO ESPECIAL A PORTO PRÍNCIPE

Os generais Henry Hugh Shelton e David Meade, comandantes das tropas norte-americanas que invadiram o Haiti, concederam ontem a primeira entrevista depois da chegada ao país.
Falaram num prédio de quatro andares, a 1.000 metros do oceano, na sede do Usis (Serviço de Informação dos EUA). Os dois entraram em contradições políticas.
Shelton, o comandante supremo, elogiou quatro vezes o general haitiano Raoul Cedras (pronuncia-se "cedrá"). Meade, segundo homem na hierarquia militar, ficou ciente do problema que os elogios causariam e enveredou por uma série de elogios ao presidente deposto Jean-Bertrand Aristide, que os americanos se comprometeram a trazer de volta ao país.
Shelton concluiu que Cedras "proporcionou uma situação de respeito mútuo, cooperou muito conosco". Questionado sobre os distúrbios registrados na capital haitiana, onde grupos que se reúnem nas ruas têm sido espancados à morte pela polícia, afirmou que os EUA "não vão se intrometer nos problemas internos do Haiti".
Dois metros de altura, sotaque seco, parecido com Silvester Stallone, Shelton falou usando seu uniforme de campanha –não se esquecendo de trazer no pulso uma bússola e no dedo mínimo da mão direita um anel com a insígnia do Exército norte-americano.
Ao seu lado, com sotaque texano, sentava-se Meade, anotando tudo o que o comandante falava. Eles mantêm diariamente duas conversas a portas fechadas com Cedras. Veja trechos da entrevista.

Pergunta - Como está a situação hoje?
Henry Shelton - Hoje estamos com 6.000 soldados e amanhã chegaremos a 10 mil. Com a concentração de forças no Cabo Haitiano (norte do país), começaremos a colocar agora soldados nas ruas.
Pergunta - A operação saiu como o sr. esperava?
Shelton - Quarenta e oito horas antes da invasão, nós esperávamos uma coisa bem diferente. O general Cedras propiciou uma situação de respeito mútuo. O que mais importa é essa cooperação, não interessam os problemas internos. A polícia de Cedras tem empregado uma força desnecessária. Esperamos que ele use sua influência para controlar a polícia.
Pergunta - Para onde estão indo as operações?
Shelton - As operações estão se estendendo para o campo, sobretudo em direção ao Cabo Haitiano. Estamos tendo algumas manifestações nas ruas e muita concentração de gente, porque os haitianos não estão acostumados a operações tão exuberantes; daí a ocorrência de alguns distúrbios.
Cedras não tem o controle de sua polícia. Para evitar distúrbios, vamos distribuir às TVs uma fita para mostrar à população o que viemos fazer aqui. Esperamos uma mudança de atitude da polícia.
Estão ocorrendo violações dos direitos humanos. Se o sr. Cedras não tomar os passos apropriados, nós vamos dizer num clima de respeito que passos ele deve dar. Também vamos distribuir 1 milhão de cestas básicas, para matar a fome da população até a transição para a democracia.
Pergunta - O que as forças preparam para a semana que vem?
David Meade - Desembarcaremos mais 4.700 homens em 35 aviões C-5. Com isso, vamos preparando o terreno para a volta da democracia e de Aristide.
Veja que nossa missão é governamental, não estamos trabalhando apenas para o Departamento de Estado. Devo dizer que a recepção que tivemos foi muito melhor do que o esperado. Estamos fazendo tudo para a volta de Aristide em segurança. Ontem, prendemos quatro militares haitianos e confiscamos suas armas.

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