São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Lixos eleitorais

JANIO DE FREITAS

Os porões das disputas eleitorais guardam muito mais lixo moral do que se suspeita. Se o exercício de mandatos se confunde tanto com fraudes, subornos, estelionato, trapaças de todos os tipos, estes políticos não seriam mais éticos na disputa dos cargos tão ambicionados.
Em entrevista recente, a deputada Cidinha Campos –a cuja luta solitária devemos a descoberta das quadrilhas que têm agido sobre o INSS– lembrou que os arrastões e brigas de bandos nas praias começaram quando Benedita da Silva (PT) cresceu nas pesquisas, ao disputar a prefeitura do Rio com César Maia (PMDB-PSDB). E cessaram absolutamente, tão logo produzido o seu efeito eleitoral. Coincidência?
Já se dá como certo que Anthony Garotinho (PDT) disputará o segundo turno com Marcello Alencar (PSDB) e com possibilidades de vencer, dados os indícios do seu crescimento.
Em quatro pontos bem distantes entre si, anteontem houve tumultos esquisitos, simultâneos dois a dois. Fracassada uma tentativa de arrastão, criaram uma suposta briga de bandos em Ipanema, enquanto no quebra-mar da Barra acontecia algo parecido. No final da tarde, uma suposta perseguição a suspeitos que ninguém viu levou a polícia a atirar a esmo, inclusive de um helicóptero, no superpopuloso Barrashopping, enquanto em Copacabana funkeiros atiravam de um ônibus em outro. Tudo coincidência?
Pois houve mais coincidência. Nos diferentes locais para onde foram levados, os presos tiveram o mesmo tratamento por parte da polícia: foram soltos.
Combustível eleitoral
O bilheteiro Alexis Stepanenko saiu do governo antes de cumprir a mais importante missão eleitoral que lhe estava reservada: anunciar, nestes dias finais da disputa eleitoral, a queda do preço da gasolina. Ao que se seguiria o festival de manchetes impressas e televisivas: preço da gasolina cai pela 1ª vez no Brasil. Real faz cair até o preço da gasolina.
Ou porque os dois cabos-eleitorais mais decididos tenham sido forçados a deixar seus ministérios, da Fazenda e das Minas e Energia, numa advertência involuntária aos que ficaram; ou porque seus substitutos tenham mesmo mais pudor, o confronto entre os favoráveis e os contrários à artimanha está, hoje, no primeiro nível das divergências no governo.
A assessoria da Fazenda é, claro, favorável. O ministro Ciro Gomes, até agora, não. O ministro interino das Minas e Energia está na moita.
Pela ética
Encabeçadas por OAB, CNBB, ABI, Movimento pela Ética na Política e Federação dos Jornalistas, as 50 entidades que indicaram os integrantes da Comissão pela Ética nas Eleições tiveram a gentileza de acrescentar meu nome aos de Barbosa Lima Sobrinho, Raymundo Faoro, Marcelo Lavenère, Evandro Lins e Silva e Fernanda Montenegro.
Agora formalizado o convite, que alguns jornais anteciparam há uma semana, vejo-me na desagradável obrigação de comunicar também aos possíveis leitores que não estarei na Comissão. Entendo que, como jornalista, devo ser objeto da mesma fiscalização a que os demais jornalistas devem ser submetidos. E, se integrando a Comissão, talvez não deixasse à vontade, para considerações sobre meu trabalho, os demais fiscalizadores. Julgo que, com minha ausência, estarei contribuindo melhor para a ética.
A Folha opinou contrariamente à criação da Comissão pela Ética nas Eleições. Mas, com a liberdade que o jornal me concede por sua própria independência, daqui prestarei à Comissão as colaborações ao meu alcance.

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