São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Emprego ou trabalho, o grande desafio

DOROTHÉA WERNECK

Tratar da miséria, da pobreza e do desemprego já não é mais um privilégio dos países subdesenvolvidos. Com o crescimento da violência e do número de desempregados (35 milhões de pessoas nos sete países mais ricos e uma taxa de desemprego que chegou este ano a 25% na Espanha), o mundo resolveu tratar com seriedade o problema e enfrentar o desfio.
A ONU (Organização das Nações Unidas, o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e vários outros organismos internacionais recolocaram nas suas agendas a busca de medidas para incorporar os marginalizados e os excluídos do processo de crescimento. O que fazer?
Os candidatos à Presidência da República, ao tratarem da questão do emprego, já identificaram os principais pontos: retomada firme do crescimento (e para isso o mais importante é aumentar os investimentos); apoio às micro e pequenas empresas; expansão dos investimentos em infra-estrutura; maior qualidade e produtividade acompanhada por redução dos desperdícios; diminuição dos encargos sociais (reduzindo os custos da mão-de-obra); e tantas outras medidas que certamente poderão aumentar o número de vagas nos setores produtivos da economia.
A pergunta que permanece é se este crescimento na oferta de empregos será suficiente para absorver todos os desempregados e subempregados. A julgar pela experiência dos países mais ricos, a resposta deverá ser negativa.
Olhar para o setor produtivo como o único destino de todos os cidadãos que querem trabalhar é ter a visão antiga de que, para ser respeitada, a pessoa necessita de um salário e de sua carteira de trabalho assinada.
O conceito de "trabalho" precisa ser mais abrangente, incluindo todas as atividades que permitam às pessoas contribuírem para a sociedade, realizando-se como seres humanos. O que é reconhecido no mundo de hoje é o "talento" e, como disse Peter Drucker, vale tanto o talento de um especialista em informática como o de um tocador de tuba.
As artes, os esportes, a cultura e o lazer deverão fazer parte das alternativas de trabalho. Infelizmente, ainda não encontramos na nossa sociedade uma visão clara da importância dessas atividades. O papel do governo, da iniciativa privada e da própria sociedade civil, isoladamente ou em parceria, é criar as condições necessárias para o seu crescimento.
Linhas de financiamento, desregulamentações (ou novas leis de estímulo a essas atividades), patrocínios, valorização da contribuição da cultura para o desenvolvimento do país (com o pagamento de um preço justo para assistir a um espetáculo) poderão complementar as medidas mais tradicionais de "geração de emprego e de renda". Essa discussão ainda não faz parte do debate político. A esperança é de que daqui a alguns poucos anos, o apoio à cultura, aos esportes e às artes sejam um fato tão natural quanto a preocupação que hoje temos com o meio ambiente. Se o movimento ecológico conseguiu avançar nos últimos tempos, também a preocupação com as pessoas poderá ter seu lugar na sociedade do futuro. Basta reconhecer que é grande o talento dos brasileiros nessas atividades e que, do ponto de vista econômico, a "indústria" do entretenimento pode se transformar em um importante setor da economia brasileira (hoje é um item importante das exportações dos Estados Unidos). Dar suporte para essas atividades pode significar aumentar ainda mais o turismo no Brasil, setor que mais tem crescido no mundo, nos últimos anos.

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