São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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'Derivativos' explodem no mercado externo

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Se você não está confuso é porque não esteve prestando atenção".
Frase-lema repetida no programa de televisão americano "Wall Streett Week"
A globalização e a desregulamentação dos mercados financeiros têm permitido uma vigorosa expansão dos empréstimos internacionais e das formas de buscar proteção contra riscos com os chamados "derivativos". Alguns amigos me pediram para explicar o que são esses papéis.
"Derivativos" é o nome genérico dado a contratos cujo rendimento se dá em função do valor esperado no futuro de papéis primários ou de posições especulativas. Um "derivativo" é um contrato cujo valor é baseado no ou derivado do comportamento de outros mercados.
Os "derivativos" podem ser divididos em três tipos. Há os contratos de "swaps", em que duas partes contratantes acordam que, por certo período, irão trocar certo tipo de risco contra certo pagamento.
Por exemplo, em um contrato de "swap" de juros, uma das partes paga à outra uma taxa de juros fixa sobre um montante de principal, transferindo à segunda a obrigação de servir o montante de principal tomado a uma taxa de juros flutuante.
Outro tipo são os contratos de opção. Um investidor com um contrato de opção de ação, por exemplo, pode ter um lucro ou um prejuízo à medida que o preço daquela ação suba ou desça, mesmo que não possua nenhuma ação. As opções podem ser tanto sobre ações, sobre índices, quanto sobre qualquer fluxo de pagamentos futuro.
O tipo mais frequente de derivativos são os contratos de futuros em que alguém se compromete a comprar algo a certo preço e alguém se compromete a vender esse bem a tal preço no futuro. Contratos futuros de câmbio e de commodities agrícolas são os mais conhecidos.
O crescimento dos derivativos é uma faceta da internacionalização dos mercados de capital. A multiplicação desses contratos deriva da busca por proteção, contra a volatilidade dos mercados.
Contribuem também a redução dos custos de transação com o avanço tecnológico em computação e telecomunicação e a forte competição que existe entre bancos, corretoras e outros intermediários nos mercados externos.
Os derivativos são usados tanto para reduzir riscos (agentes avessos ao risco), quanto para tomar riscos (aos adeptos do risco). Basicamente, os derivativos permitem exposição a um mercado a um preço relativamente baixo em termos do fluxo de caixa de um investidor.
Os riscos incorridos são conhecidos. Há o risco de mercado (vulnerabilidade a flutuações de preços), o risco da contrapartida (ameaça de inadimplência de outra parte), risco de liquidez (quando o papel não pode ser reposto a um preço adequado), risco operacional (falhas de controle interno, inclusive erros e fraudes) e o risco legal (quando uma das partes não está autorizada a conduzir tal operação).
A preocupação maior com os derivativos não se deve tanto à natureza dos riscos incorridos, mas sim ao contexto do mercado, que é bastante opaco. Uma parcela grande desse sistema não é submetida à supervisão ou à regulamentação financeira.
Por exemplo, muitos negócios são conduzidos por partes que revelam de maneira inadequada a natureza dos negócios e sua saúde financeira. Ademais, as regras contábeis de apreçamento dos contratos não são uniformes (como apreçar bem uma opção que vence dois anos à frente?).
Algumas perdas importantes com derivativos são conhecidas. A Kashima Oil do Japão teve um prejuízo de US$ 1,5 bilhão porque fez contratos cambiais de alto risco. A Metallgesellshaft alemã perdeu U$ 1,4 bilhão com derivativos de petróleo e a Procter e Gamble dos Estados Unidos perdeu U$ 102 milhões em contratos futuros de juros.
Separados dos mercados padronizados, cresceram os contratos designados como "fora do balcão" ("over the counter"). São negócios talhados para servir às necessidades específicas de empresas que buscam proteção contra os riscos da volatilidade.
Evidentemente, os mercados "fora de balcão", onde grandes bancos podem oferecer contratos particularizados aos clientes, são os que permitem margens mais elevadas. Aqui, apenas a criatividade financeira do banco serve de limite para o potencial de expansão dos contratos. O Banker's Trust tem sido o líder desse mercado.
O risco mais temido com os derivativos é o "risco sistêmico". Há uma concentração de negócios em um pequeno número de instituições financeiras de grande porte, atuando em muitos mercados.
Se uma delas falir ou ficar inadimplente, pode instabilizar diversos mercados ao mesmo tempo e levar a quebras em cadeia. Nesse ponto, os bancos centrais seriam obrigados a intervir.
Os valores envolvidos são elevados. O comitê de bancos da Câmara dos Deputados americana estimou que o valor nocional do principal dos contratos de derivativos alcançava US$ 15 trilhões no final de 1991.
Mas pode ser que valha a tese de Martin Mayer, da Brookings Institution de Washington, segundo a qual os instrumentos para transferir risco terminam por empurrar riscos maiores sobre os menos capacitados a absorvê-los. O recente exemplo brasileiro de quebra de bancos pequenos que cacifavam com a dívida pública serve de exemplo.

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