São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Como e para onde mudar

MANOEL FRANCISCO PIRES DA COSTA

Um automóvel importado sai atualmente da fábrica com cerca de US$ 670 em aço e quase US$ 800 em componentes eletrônicos. Pergunta-se: será possível montar uma estratégia de poupança e investimento ignorando a enorme quantidade de novas empresas que entram no circuito industrial todos os anos, por conta dos avanços tecnológicos?
Tais reflexões ocorrem quando consideramos a performance da economia do Estado de São Paulo, que de 40% do Produto Interno Bruto do Brasil em 1982 caiu para 35,6% em 1992, sem sinais de que tenha estabilizado recentemente ou revertido a tendência declinante.
Ora, é exatamente em São Paulo onde se localiza a maior concentração de empresas privadas, com ampla diversificação da base produtiva. Aqui, a agroindústria é particularmente forte, com a maior parte da produção de álcool e quase todo o leque da indústria alimentar.
São Paulo é também a base da indústria mecânica, de autopeças, de equipamentos para escritório, automação, bens de consumo duráveis em geral e serviços financeiros. Como acertar novamente o passo com o crescimento e a geração de empregos?
A estabilidade da moeda é fundamental para qualquer novo surto de desenvolvimento, mas com frequência vêm-se esquecendo um lado muito importante da moderna equação que combina poupança, de um lado, e investimento, do outro.
Tome, por exemplo, os dados de uma pesquisa sobre taxas de retorno a longo prazo de diferentes investimentos feitos nos Estados Unidos. Alguém que, por volta de 1967, aplicou US$ 100 em ações de pequenas empresas cotadas em Bolsas, deixando o capital acumular dividendos e rendimentos, obteve em sete anos um retorno de US$ 2.757.
O retorno médio anual das empresas de menor porte, segundo o mesmo estudo, tem sido em torno de 12,36%, contra 10,33% para as empresas de grande porte, 5,02% para os títulos do Tesouro de longo prazo e uma inflação de 3,13% ao ano.
A estabilidade da economia e a vertiginosa diversificação das atividades industriais e de serviços obrigarão o poupador individual, o fundo de investimento ou de pensão, a levar em conta essa nova realidade também no Brasil.
Como, porém, saber que empresas ou acionistas encontram-se detrás dos US$ 800 em componentes altamente sofisticados que entram num automóvel ou dos fatores tecnológicos agregados em diferentes ramos de atividade? Ou o que acontece na indústria de alimentos, de vestuário, na construção civil, na indústria de sapatos? Esta é, evidentemente, uma área para especialistas. Mas, mesmo assim, é transparente para o homem comum.
É a curiosidade natural dos cidadãos sobre a saúde da economia que explica o interesse das pessoas pelos índices das Bolsas. Consciente ou inconscientemente, o que a população tenta conferir, quando olha para os índices ou valores das ações, é a saúde atual ou futura das empresas.
O índice Bovespa negociado no mercado à vista e no mercado futuro da BM&F é composto por 53 empresas. É natural que as pessoas olhem para esse termômetro tentando enxergar o que o futuro nos reserva.
Se o Brasil entrar em um período de estabilidade com a nova moeda, a economia nacional não irá se comportar de forma diferente do que acontece nos Estados Unidos, na Europa ou no Japão.
Nesses países, o mercado de ações cresceu horizontalmente, incorporando milhares de novas empresas que abrem o capital e oferecem a investidores locais e estrangeiros uma rentabilidade acima da média, além de empregar mais mão-de-obra.
Isso vai exigir especialização para administrar porta-fólios. Trata-se de uma área onde as corretoras e os corretores têm uma experiência histórica. É preciso criar, com urgência, novos estímulos para a especialização das corretoras, reformulando também os mecanismos para o investidor externo (Anexo 4º).
Deve-se impedir que, por falta de alternativas, os mercados de títulos de empresas brasileiras se desenvolvam no exterior, em detrimento do mercado de capitais brasileiro.
O atraso eventual no setor brasileiro de serviços pode frear a diversificação de porta-fólios. Ou, pior ainda, fomentar uma internacionalização errada, transferindo liquidez para as Bolsas estrangeiras, marginalizando o investidor local e dificultando ainda mais o amadurecimento de uma cultura adequada à abertura de capital das empresas no Brasil.
A base industrial e agroindustrial de São Paulo está montada para dar passos importantes, pois aqui se concentra o maior número de empresas que podem chegar ao mercado de capitais. É preciso que as plataformas políticas incorporem esse item, até agora pouco focalizado nos discursos de campanha.
Não há como recriar o capitalismo brasileiro com modelos das décadas passadas, altamente concentradores de capital, porque a regra geral é hoje a busca incessante do consumidor, a diversificação do risco, o crescimento de baixo para cima, a ampliação da base acionária e uma grande ênfase nos investimentos em milhares de pequenas e médias sociedades anônimas.
Um rápido processo de abertura de capital somente se fará com o fortalecimento das Bolsas, criando-se caixas capazes de redistribuir fundos com a finalidade específica de apoiar uma nova infantaria de corretores, cuja missão será ampliar horizontalmente os mercados.

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