São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Eleições, núcleo reformista e Constituição

ANTONIO KANDIR

Com o processo eleitoral já bastante avançado, é inevitável que se busque antecipar o quadro político que irá nascer das urnas. Nessa perspectiva, importa sobretudo responder à seguinte questão: haverá condições políticas favoráveis à realização da reforma da Constituição? Ou, de modo pragmático, como construir as condições para um processo positivo de reforma constitucional?
Dado que a reforma da Constituição é condição indispensável para consolidar a estabilidade econômica e retomar o desenvolvimento em bases firmes, é evidente que o sucesso do próximo governo depende, em larga medida, da sorte da reforma constitucional.
Não há por isso exagero em afirmar que o governo estará jogando uma cartada decisiva já no primeiro semestre de 1995. Se as reformas constitucionais forem feitas, em grande parte ou no todo, será mais fácil a consolidação da estabilidade e mais rápida e vigorosa a retomada sustentada do desenvolvimento econômico.
Caso contrário, crescem as chances de um processo truncado de reformas, com o Executivo tornando-se refém de forças corporativas e fisiológicas, num quadro de deterioração econômica.
São várias as questões constitucionais importantes (Previdência, sistema tributário, regime fiscal, monopólios, etc.) e é muito provável que o alinhamento de forças, no Congresso, seja diferente a cada questão em pauta.
Dificilmente haverá um bloco favorável às reformas que esteja de acordo em todas as questões específicas, opondo-se a um bloco homogêneo contrário a toda e qualquer mudança constitucional.
Deverá prevalecer o que o professor Luciano Martins denominou de "geometria flexível", no contexto de um Congresso bastante equilibrado quanto ao peso dos partidos (a expectativa é de que PFL, PMDB e PSDB formem as maiores bancadas, com PPR, PT e PDT, mais PTB e PP, contando com bancadas expressivas).
Acresce que o processo de reforma será necessariamente bastante conflitivo, já que, a cada questão em pauta, uma coleção de interesses estará em jogo.
Nesse quadro, é de grande importância consolidar-se um núcleo reformista que possa imprimir direção firme e consistente ao processo de mudança da Constituição, evitando que ele sucumba à radicalizações paralisantes ou que se perca em acordos pontuais inconsistentes entre si.
Será decisiva a presença no Executivo de forças comprometidas com a reforma e com uma visão clara do que deve ser feito. A Presidência da República terá papel protagonista no processo.
Tudo isso é verdade, mas todos sabemos que, por mais imprescindível que seja, a liderança do Executivo não é suficiente para produzir as mudanças constitucionais.
É preciso que, no Congresso, haja clareza quanto aos rumos a seguir, competência técnica para propor e analisar proposições e capacidade política para articular apoio majoritário às mudanças. O apoio majoritário às mudanças terá de nascer de ampla e madura negociação entre os partidos.
A julgar por declarações firmes de Fernando Henrique, cuja veracidade é atestada por seu estilo de fazer política, de que não irá embarcar nem deixar-se enredar na barganha por cargos, há boas chances, se efetivamente ele for eleito, de que essa negociação esteja o mais livre possível de antigos vícios da política brasileira.
O Congresso e os partidos terão assim a oportunidade de pavimentar o caminho para a consolidação da estabilidade, a retomada do desenvolvimento e o aprofundamento da democracia. Não poderão desperdiçá-la, sob pena da desmoralização total.
Os que se opuserem de modo irresponsável à realização das reformas terão de haver-se com a vasta maioria do eleitorado, que está votando a favor do Plano Real e das mudanças que o permitam seguir em frente.
É preciso que os representantes no Congresso entendam o que, a seu modo, o eleitor já entendeu.

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