São Paulo, segunda-feira, 26 de setembro de 1994
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Uma ilusão na Presidência

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A última pesquisa Datafolha, publicada ontem, indica que a eleição pode mesmo acabar no primeiro turno. A se confirmar esse resultado, o país não terá votado nem em Fernando Henrique, nem em Lula.
O brasileiro estará elegendo uma esperança. Fernando Henrique será mero "testa-de-ferro" da fé. Edmar Bacha e o resto da equipe econômica serão mais presidentes do que o candidato tucano.
O eleitor se prepara para acomodar no Palácio do Planalto uma única e frágil promessa: a perspectiva de manutenção da estabilidade econômica.
Trata-se de uma promessa solitária porque o eleitor está pouco se incomodando com o resto do programa de Fernando Henrique. E frágil porque o trabalho sequer começou.
Nenhum dos cobiçados ajustes definitivos foi providenciado. Enterrou-se a reforma constitucional. Adiou-se o ajuste fiscal, substituído pelo remendo do Fundo Social de Emergência.
A Previdência ainda é um buraco inadministrável; equilibra-se no "fio da navalha", diz o ministro Sérgio Cutolo.
A economia brasileira ainda é um paciente anestesiado. Aberta e acomodada sobre a maca, aguarda que lhe façam a cirurgia final.
A operação não será simples. É trabalho para toda uma gestão. Apresentado nos discursos de Fernando Henrique como uma obra acabada, o real é mero ponto de partida.
A parte mais complexa está por ser feita. Daí o crescente prestígio eleitoral de Fernando Henrique. O eleitor identifica no candidato tucano a expectativa de continuidade de uma idéia.
Não há nenhum mal em fazer-se uma aposta na esperança. A rigor, vota-se em determinado candidato pelas idéias que ele representa. Lula, aliás, despencou porque sua campanha não foi capaz de produzir uma idéia motriz.
Mas convém ressaltar que o sonho é, invariavelmente, vizinho da decepção. O eleitor fará uma aposta. Pode ganhar. E pode perder.
O brasileiro não tem direito à decepção. Perdeu com a Constituinte, com Tancredo, com o Cruzado, com Collor... Mas a quase unanimidade que se forma em torno do real indica que sua taxa de credulidade está próxima do infinito.
Programas econômicos anteriores também renderam aos seus autores e executores fantásticas taxas de prestígio. Nem por isso, o país obteve a estabilização definitiva. Depois de votar, é preciso vigiar.

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