São Paulo, segunda-feira, 26 de setembro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Paulo Pasta confronta 'estridência' da Bienal

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Paulo Pasta, 34, vai se sentir como escoteiro em bordel na 22ª Bienal Internacional de São Paulo, que será inaugurada no dia 12 de outubro.
Não bastasse ser um dos poucos pintores entre os mais de 200 artistas do evento, Pasta faz uma pintura que exige silêncio, contemplação e paciência. "Nada a ver com a estridência da Bienal", diz ele mesmo.
A tese que baliza a 22ª Bienal é "o rompimento do suporte". Para o curador Nelson Aguilar, a arte contemporânea se formou nos anos 60, quando o chassi da tela e a base da escultura foram abandonadas, inventou-se a instalação e a performance, e novas tecnologias foram incorporadas à arte.
Com essa tese, espera-se da 22ª Bienal uma apoteose da instalação como a última Bienal de Veneza em 1993. Pasta, por sua vez, é um radical do suporte. Uma de suas maiores influências é Iberê Camargo, pintor brasileiro morto este ano, de quem a Bienal também terá telas –não à toa, na sala vizinha à de Pasta (leia texto ao lado).
Como Iberê, Pasta enfrenta obsessivamente a superfície bidimensional da tela, e não pensou e não pensa em abandonar essa luta.
"Pintura exige tempo", diz Pasta. "Se você pensa na carreira de Iberê, vê que ele ficava durante anos fazendo a mesma coisa, pesquisando uma mesma forma."
Outra influência de Pasta, esta mais dominante, é a pintura do italiano Giorgio Morandi (1890- 1964). Como Morandi, Pasta faz uma pintura que procura incorporar o tempo, em que as imagens parecem estáticas, suspensas de sua existência concreta. Não há mensagens, apenas sugestões.
Eis outro motivo para Pasta se sentir deslocado. Seu estilo tem pouco da politização, da ambição e do exibicionismo da arte dos anos 90. "Para mim a realidade se forma na memória. É como se o presente não existisse", diz.
Em seguida, apanha o livro "Arte Moderna", do crítico italiano Giulio Carlo Argan, e aponta trecho sobre Morandi em que Argan fala da necessidade que o pintor sentia de buscar "a consciência que unifica sujeito e objeto".
Pasta não gosta de maniqueísmos: sujeito ou objeto, realismo ou abstracionismo, forma ou conteúdo, expressão ou construção. Quer "unificar" os pólos –por sinal, um empenho que é sem dúvida contemporâneo.
Exemplifica com Alfredo Volpi (1896-1988). "Em Volpi, a bandeirinha se tornou um simples pretexto para o exercício da pintura." Como as bandeirinhas de Volpi, as garrafas de Morandi e os carretéis de Iberê, Pasta procura seu "pretexto". Por enquanto, a forma básica que sua pintura vem usando se assemelha a uma lajota de pedra.
Mas nada impede que uma figura mais simbólica surja. "Iberê voltou no final dos anos 70 a uma pintura mais figurativa. Ele ganhou esse direito. Eu ainda tenho de ganhar", diz Pasta. "Mas não posso chegar e dizer: a forma será esta. O ato de pintar é que vai mostrar. Me sinto com uma vela num quarto escuro, que ilumina apenas uma pequena área."
Na sala de 10m x 12m que terá na 22ª Bienal, Pasta vai mostrar dez pinturas inéditas. São telas a óleo, com nuances de cor sutis, às vezes perceptíveis apenas se o observador se posicionar obliquamente ao quadro. A quantidade de passagens e camadas pede um olho minucioso –probabilidade baixa em meio à parafernália da Bienal. Mas, diz Pasta, "sempre há três ou quatro pessoas que percebem".

Texto Anterior: Tracy se consagra como americano médio
Próximo Texto: Pintores brasileiros são dois
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.