São Paulo, terça-feira, 27 de setembro de 1994
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PT, paixão e razão

O Partido dos Trabalhadores costuma despertar paixões. Para alguns, é o próprio inferno de Dante, a bula da decadência. Para outros, é o caminho da verdade, do qual não pode haver desvio.
Numa análise menos apaixonada, o PT é um partido que –goste-se ou não– acabou por influir decisivamente na agenda política do Brasil, abrindo espaço para diversos grupos políticos e sociais que, de outra forma, talvez estivessem atuando à margem do campo institucional. O PT conquistou, desde o final dos anos 70, um espaço próprio na política nacional que deve sobreviver ao pleito de 1994.
Tal sobrevivência, entretanto, não será automática nem tranquila. Trata-se afinal de um partido com as costumeiras tendências internas e, mesmo sendo de esquerda, tem as suas próprias esquerda e direita. A sobrevivência do PT depende portanto não apenas dos resultados da semana que vem, mas do seu próprio amadurecimento.
É inegável que o PT conseguiu firmar-se como um ponto de referência, sobretudo no que diz respeito aos ultrajantes níveis de distribuição de renda do Brasil.
É claro que nenhum partido político, por mais conservador que seja, jamais defendeu abertamente o atual status quo. Ainda assim, o fato de a questão da miséria ter finalmente entrado na agenda nacional deve-se, em boa medida, à atuação do Partido dos Trabalhadores. Poder-se-ia ainda acrescentar o papel meritório que a legenda teve no ligeiro aprimoramento dos péssimos costumes políticos do país.
Mas há outros temas na agenda nacional que exigem revisões programáticas e estratégicas até hoje adiadas no partido, como os que se referem ao papel do Estado e do capital estrangeiro.
Ademais, o PT acabou firmando a imagem de um partido radical que se propõe a transformar completamente o país, embora jamais tenha deixado claro de que forma essa transformação se daria.
Se essa estratégia rendia frutos até alguns meses atrás, quando a nação vivia uma pesada crise de pessimismo, ela parece ter-se tornado um fardo com a reversão das expectativas em função do Plano Real, como sugerem hoje as pesquisas de intenção de voto.
Qualquer que seja o desfecho desta eleição, o Partido dos Trabalhadores tem uma responsabilidade de dimensão impensável quando de sua fundação. Só resta esperar que sua liderança e seus quadros estejam à altura dessa responsabilidade, perdendo ou ganhando o pleito presidencial.

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