São Paulo, quarta-feira, 28 de setembro de 1994
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O Congresso não cairá do céu

ANTONIO DELFIM NETTO

Na próxima semana o Brasil vai às urnas para definir a quem entregará o seu destino no período 1995-1998. Quatro anos que podem ser brilhantes ou trágicos. O que eles serão não cairá do céu, nem das urnas da Argentina. Cairá das mais de 200 mil urnas distribuídas por todo o país e onde cada brasileiro será 1/94.000.000 de avos da vontade nacional.
Contraditórios sentimentos dominam a sociedade. De um lado, ela degusta uma estabilização que deseja ardentemente, mas não tem certeza sobre a sua continuidade. De outro, amarga uma enorme decepção com o funcionamento das instituições. Sente que estamos longe de ser uma federação verdadeira. Sabe que não somos uma república. Assiste, indignada, a submissão do Congresso à vontade do Executivo e o desenrolar de escândalos (verdadeiros e falsos!) envolvendo uns poucos parlamentares. É muito mal informada sobre o funcionamento e os mecanismos decisórios do Congresso e é levada a avaliá-lo pela quantidade de projetos aprovados diariamente...
A indignação é certamente positiva. Mas não deve levar o cidadão à convicção de que votar não vale a pena. Ao contrário, só votando mais e cada vez mais, criticamente, ele poderá modificar essa situação. O mais importante é que cada um compreenda que está nas suas mãos, afinal, a possibilidade de prolongar a estabilização e aperfeiçoar as instituições.
A continuidade do Real depende de uma profunda modificação constitucional que deve realizar-se ao longo dos próximos anos. Primeiro, uma reforma da sua parte operacional. Uma reforma fiscal que racionalize a estrutura tributária e dê nova orientação e eficiência aos dispêndios públicos. Uma reforma da seguridade social que garanta o financiamento adequado do sistema e dê aos aposentados as garantias mínimas a que eles têm direito. Uma radical reforma do Estado, que está afundando sobre o peso de uma burocracia que transformou os recursos destinados aos serviços públicos em seus próprios fins. Uma dramática redução dos monopólios politicamente construídos. Uma aceleração do processo de privatização, para livrar as empresas estatais da corrupção a que foram submetidas pelo poder político a partir da Nova República.
Depois, uma ainda mais profunda reforma política. Temos de acabar com o presidencialismo imperial. Temos que dar uma nova oportunidade à nação para que escolha um regime parlamentarista. Temos de construir um sistema de voto distrital misto. Temos que exigir dos partidos um mínimo de representatividade para participar do Congresso. E temos de instituir a fidelidade partidária.
Fazer isso está nas nossas mãos. Basta eleger um presidente realmente comprometido com a estabilidade e com essas reformas. E eleger um Congresso (deputados e senadores) compromissado com essas idéias.
Indignado sim, mas omisso não. Boa sorte!

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