São Paulo, quarta-feira, 28 de setembro de 1994
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A coragem de dizer a verdade

FRANCISCO ROSSI

Muitos são os problemas que afligem a população do Estado de São Paulo. No entanto, a solução começa, inexoravelmente, por uma pergunta que deve ser respondida com responsabilidade e conhecimento de causa. Como um governador pode enfrentar dificuldades que demandam bilhões e bilhões de dólares em investimentos, quando sabemos que a máquina do governo estadual está inchada, emperrada, não funciona, assim como o próprio governo do país?
Todas essas questões, que representam a falência do ensino, a falta de atendimento médico, de segurança, transporte, habitação, são sintomas de uma grave doença. Não adianta atacarmos apenas os sintomas. Temos, sim, de atacar as causas que estão matando esse organismo que é a máquina do Estado, hoje ineficiente, inoperante e morrendo aos poucos.
Antes de qualquer atitude é preciso fazer um diagnóstico completo da máquina. Verificar se procede a informação do excessivo número de funcionários. Como, por exemplo, o caso do Baneser, em que 18 mil funcionários, entre eles alguns humildes, servem de pano de fundo para esconder o tratamento privilegiado dado a pessoas que recebem altíssimos salários. Comente-se que só a folha de pagamento do Baneser equivaleria à folha da administração direta com 100 mil funcionários. Um escândalo!
Precisamos rever a situação desses funcionários, assim como a de milhares de comissionados que prestam serviço em todo o Brasil sem prejuízo de vencimentos, ou seja, quem paga é o governo do Estado. Precisaríamos conhecer como estão os comissionamentos dos professores e policiais militares. Sabemos que 15% dos professores estão hoje comissionados, da mesma forma que há funcionários que só marcam o ponto, até porque não há espaço físico nas repartições públicas para abrigá-los.
Em meu segundo mandato como prefeito de Osasco, logo na primeira semana de governo, apuramos que, num total de 12 mil funcionários, existiam 3.000 ociosos e 3.000 "fantasmas"! Cortamos pela metade o número de funcionários e, de repente, estava sobrando dinheiro no caixa da prefeitura. Dinheiro esse que foi canalizado para obras que alavancaram o progresso social e econômico da cidade.
Por tudo isso, não nos surpreenderíamos se, numa máquina com 900 mil funcionários, como é a do Estado de São Paulo, viéssemos a encontrar uma situação anormal envolvendo 200 mil ou 300 mil servidores. Vamos fundo nessa questão porque ela representa os recursos necessários às obras e serviços que o governo deve à população. Ninguém mais suporta o gigantismo exacerbado da máquina pública. Até mesmo as multinacionais, modelos de eficiência e rentabilidade, estão em crise em todo o mundo em função de seu tamanho.
Não podemos esquecer que São Paulo é um Estado com uma economia que se assemelha à de muitos países europeus. Podemos buscar lá fora exemplos de boa administração e adotá-los aqui. Um espelho dignificante pode estar nos "tigres asiáticos".
Eles provaram que um país não precisa ser auto-suficiente em petróleo ou minérios para ser pujante, e desenvolveram fórmulas no âmbito de serviços que os fez competitivos, ricos e com uma renda per capita invejável. Souberam investir naquilo que um país tem de mais importante: o ser humano.
São Paulo deve liderar o processo de modernização do Estado brasileiro. Aqui no Brasil, tem-se a idéia de que se resolvem problemas como o do salário através de leis. Na verdade, falta eficiência e organização para gerar empregos e facilitar a captação de investimentos.
Em sã consciência, qualquer governante sabe da importância de obras como a segunda pista da Imigrantes ou a duplicação da Regis Bittencourt, necessárias até quanto ao escoamento da produção. O mesmo pode-se dizer do desenvolvimento do Vale do Ribeira, a região mais pobre do Estado, ou do problema das enchentes em São Paulo, questões que exigem todas as providências possíveis.
Outro ponto relevante é a construção de novas prisões, que deve ser norteada com a finalidade de proporcionar ensino profissionalizante ao detento, pois sua ociosidade dilapida os cofres públicos e quem acaba pagando a conta, como sempre, é o próprio povo.
O restabelecimento da qualidade do ensino público é fundamental. Basta lembrar como a escola pública funcionava há 40, 50 anos. Oferecia condições para que o aluno ingressasse na faculdade sem os célebres cursinhos.
Por outro lado, torna-se extremamente necessária a valorização e o estímulo ao trabalho realizado pelas universidades paulistas, pois não devemos esquecer que os investimentos em pesquisas e equipamentos visam melhorar e ampliar sua produção científica e cultural.
A construção do grande anel viário é uma obra imprescindível à área metropolitana. As marginais estão completamente congestionadas. Não existe opção para veículos, especialmente os de carga pesada. Outro ponto a ser abordado é a recuperação do transporte ferroviário, pois é barato, funciona bem nos países desenvolvidos, mas aqui se encontra estagnado.
Enfim, as necessidades são grandes.
Unindo minha experiência administrativa à ética cristã, pretendo utilizar os recursos disponíveis, sempre visando o bem-estar e a qualidade de vida dos habitantes. Com os pés no chão, desejo moralizar a máquina estadual para que cumpra realmente seu papel, ou seja, servir aos que são o principal motivo de sua existência.

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