São Paulo, sexta-feira, 30 de setembro de 1994
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Aniversário silencioso

JANIO DE FREITAS

Completados dois anos do afastamento de Fernando Collor, há pelo menos duas fortes justificativas factuais para que o dia de ontem passasse sem atos rememorativos com alguma expressão –supondo a ocorrência dos inexpressivos, que nem destes alcancei conhecimento.
Não haveria como celebrar a vitória do movimento contra Collor sem haver uma só consequência judicial a ser mencionada. A morosidade do Judiciário é dos mais concretos lugares-comuns dos ressentimentos brasileiros em relação aos poderes do Estado. A impunidade não lhe fica atrás, se é que ainda não passou à frente. Pois nem no caso excepcional do afastamento de um presidente e dos seus associados, com as implicações judiciais que os fatos exigiam, o alto Judiciário permitiu-se abrir também ele uma exceção, nas suas tradições lamentadas e no seu conceito generalizado.
O sentimento mais objetivo que o afastamento de Collor suscita, hoje em dia, é o de condenação do Poder Judiciário e, em particular, do Supremo Tribunal Federal, onde se arrastam –se é que de algum modo se movem– as peças principais dos vários inquéritos. Excluída a perda dos seus instrumentos de operação ilegal por Collor e seu grupo, o Poder Judiciário revelou-se o grande perdedor em todo o episódio. E nisso comprometeu ainda mais a já frágil idéia de que o Brasil vive em regime verdadeiramente constitucional e medianamente democrático. Onde o Poder Judiciário não exibe a prática da Justiça não há tal regime, sequer de maneira incipiente.
Em contrapartida ao desgaste do alto Judiciário encontra-se uma vitória inconcebível ao tempo do impeachment: o esquema político de Collor, que tentou mantê-lo e ao seu grupo até os últimos recursos possíveis, os legítimos e os imorais, não sofreu sequer um arranhão. Isto já seria impensável em um regime de fundamentos constitucionais e democráticos. Não foi tudo, porém. O esquema preservou a sua posição dominante e, mais ainda, comprova-a e consolida-a na anunciada conquista da Presidência da República pela aliança em que é uma força fundamental.
Virada
O feito mais relevante destas eleições, até agora, é a virada de Cristovam Buarque na disputa pelo governo do Distrito Federal. Ao alcançar o segundo lugar nas intenções de voto, o brilhante ex-reitor da Universidade de Brasília faz mais do que se inscrever como provável disputante do segundo turno: derrota a dinheirama e a máquina acionadas pelo governador Joaquim Roriz em benefício de Valmir Campello e Maria de Lourdes Abadia, esta empurrada ainda pelos peessedebistas.
O empenho de Roriz para alijar Cristovam Buarque origina-se no risco, representado pelo candidato de oposição ao seu esquema, de inquéritos que devassem sua administração. E haveria muitos a fazer –além do que já há.

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