São Paulo, segunda-feira, 2 de janeiro de 1995
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Governo precisa de revolução mediática

ARNALDO JABOR
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O espaço do Congresso visto do alto era um mar de tapinhas e abraços numa espécie de sopa de interesses que pareciam finalmente conciliados pelo otimismo do dia.
Sarney, Benedita, Luiz Eduardo, Genoíno, todos se afagavam. ("Olha o Maluf. Agarrou o Malan", gritou uma repórter ao meu lado). Todas as camadas da política nacional, inclusive a turma do "Incidente em Antares" (Nelson Carneiro, Roberto Campos etc) tocavam nos recém-eleitos.
O poder que entra flui como um rio e se mistura com os que saem. Na mesa, supremo choque aos ingênuos, Lucena se abraçando com Galotti do STF. Apesar do aparato de dragões, a gala na praça não teve o timbre bombástico e messiânico da posse de Collor.
O discurso de Fernando Henrique não teve a pompa empinada de 90. O clima que se instalou no Congresso foi, digamos, mais "pós-moderno", e por isso mais chocho.
FHC trouxe um discurso feito de ponderações, de idéias de "processo" e com uma forte ênfase na necessidade de mudança social, falando muito em miséria, o que certamente provocou no plenário discretos bocejos das raposas e águias.
O primeiro aplauso ao discurso foi quando FHC falou em acabar com privilégios. Muitas mãos hipócritas aplaudiram.
O discurso foi com claro jeito de cartilha, de fácil entendimento, certamente pensando na mídia. Deceu a detalhes concretos e não se desmanchou em adjetivos pomposos. Faltou (ainda bem) messianismo no discurso que foi pontual e concreto: hospitais, comida etc.
Atacou os "parasitas" corporativos e falou em "revolução social de mentalidades", só possível com o concurso da opinião pública.
Resta um medo em relação ao discurso de FHC. O texto é um ideário da mais moderna razão sociológica.
Mas, em que se apóia FHC além da palpável fé das multidões? Os corporativos, os fisiológicos, os cartéis escondidos ali no Congresso, entre tapinhas e sorrisos, quem dará apoio a esta agenda racional que vai ferir interesses?
O pensamento moderno está no poder. Conseguirá modificar a resistência arcaica dos interesses?
A importância de uma estratégia "mediática" junto à frágil sociedade civil, talvez seja o ponto mais importante para fazer cumprir os desejos desse discurso de posse.

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