São Paulo, sábado, 7 de janeiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Três genialidades

JANIO DE FREITAS

O presidente Fernando Henrique e sua equipe econômica não têm sequer a desculpa, usada por vários governadores, de que não podem cumprir os deveres patronais com o funcionalismo civil e militar porque o antecessor deixou os cofres vazios. Não houve sucessão na equipe econômica, ela detém o poder absoluto sobre o dinheiro público há um ano e sete meses e, neste período, nem descontinuidade houve: mesmo quando seus chefes nominais foram Rubens Ricupero e Ciro Gomes, era notória a chefia de fato de Fernando Henrique.
A alegada falta de dinheiro para pagar os minguados 25% de correção, com os vencimentos de janeiro, até agora não mereceu uma honrada palavra de explicação do presidente, nem de qualquer integrante da equipe econômica. A correção não foi surpreendente para a equipe. A menos que nela ninguém saiba que a data-base do funcionalismo é janeiro e está determinada por lei, a 8.880 –aquela mesma feita pela própria equipe econômica para lançar a URV.
Não é menos absurdo que o secretário de Administração, Bresser Pereira, e não o ministro da Fazenda, Pedro Malan, tenha-se incumbido de dizer que não há dinheiro para pagar a correção devida. Na balbúrdia dos limites amorfos entre as áreas econômicas do governo, o Tesouro Nacional mudou de feudo, e também sobre isso a modernidade preferiu o silêncio? Ou temos, não os dois previstos pelos que consideram a incontinência de José Serra, mas três ministros da Fazenda?
Advertida pelo ministro Nelson Jobim, da Justiça, sobre os problemas jurídicos e parlamentares que o parcelamento da correção enfrentaria, a equipe econômica passou a cogitar de duas outras hipóteses. Ambas também geniais. A primeira é o adiamento da correção por alguns meses. Ora, se o parcelamento já enfrentaria problemas jurídicos e parlamentares, estes por óbvia resistência do Congresso a aprová-lo, os PHDs da modernidade econômica admitem poder sustar a correção. Dá vontade de usar um ponto de exclamação daqueles. Mas está aí uma experiência que seria interessante testemunhar: o governo testando o seu prestígio com os militares e comunicando-lhes que a ansiada correção foi suspensa, até data não sabida.
A outra hipótese cogitada, desde a advertência do ministro Jobim sobre o parcelamento bolado pelo Bresser Pereira da Administração ou da Fazenda, é o pagamento integral da correção na data adequada. Será, e a rigor já é, a confissão de que há como solucionar a alegada falta de dinheiro. A simples cogitação desta segunda hipótese denuncia maus propósitos tanto na proposta de parcelamento, como na de adiamento da correção.
Mas os 25% não são o indicador único do nível de competência administrativa e respeito humano que a equipe econômica estabelece com o funcionalismo civil e militar. Dezenas de milhares deles (estima-se que pelo menos 80 mil funcionários) entraram em férias neste mês. Advertidos oficialmente, no final de dezembro, de que os vencimentos correspondentes às férias estariam depositados em suas contas no último dia 3. Receberam até os contracheques. Mas desde o dia 3 estão fazendo pagamentos, muitos deles em viagens, com cheques sem fundos: os contracheques eram puro conto-do-vigário, não houve o depósito. Quem vai solucionar os problemas bancários e tantos outros, destes funcionários?
Também sobre isto a equipe econômica prefere o silêncio, especialmente bem guardado pelo secretário da área, o da Administração –ou, como se deve deduzir, também da Fazenda.

Texto Anterior: Segurança investiga quadrilha na Câmara
Próximo Texto: FHC indica 3 superministros para tentar contornar crise
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.