São Paulo, sábado, 7 de janeiro de 1995
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Cartas recuperam aventura dos Lumière

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Auguste (1862-1954) e Louis Lumière (1864-1948) bem podiam ter sido gêmeos. Trabalharam juntos, moraram juntos em Lyon até 1925, casaram com duas irmãs e juntos registraram cerca de 350 patentes.
Desde que –ainda meninos– intuiram sua vocação científica, fizeram um pacto de partilhar todas as invenções que fizessem, mesmo que um deles fosse o único responsável por ela.
A mais famosa de suas criações é, como ninguém ignora, o cinematógrafo. E é em torno dela e de seus desdobramentos que gira boa parte das 400 páginas de "Correspondances" (Correspondências), volume que os "Cahiers du Cinéma" publicam em homenagem ao seu primeiro século (que se comemora oficialmente em 28 de dezembro de 1995).
O volume é precioso, mesmo porque a invenção do cinema até hoje não ficou muito clara. Na mesma ocasião, uma série de outros inventores estavam na bica para criar o cinema. Thomas Edison (1847-1931) havia criado em 1889, e colocado em circulação quatro anos depois, o kinetoscópio, aparelho capaz de reproduzir imagens em movimento.
Mas, ao contrário do cinematógrafo, o kinetoscópio não se prestava a exibições coletivas e foi nisso que os Lumière se adiantaram a seus contemporâneos.
Louis Lumière, aliás, escreveu que simplesmente teve "a sorte de chegar primeiro". Mas as cartas que ele e Auguste trocam com seus principais colaboradores deixam claro que sorte não é bem a palavra (leia texto ao lado).
Além de intuir a natureza coletiva do espetáculo cinematográfico, os Lumière tinham a seu favor tanto o rigor científico, como a capacidade de se associar a colaboradores criativos.
A vida pessoal, por sua vez, passa bem menos por esta correspondência. Irrompe subitamente quando Jules Carpentier manifesta sua mágoa por não ter sido convidado para a sessão inaugural do Cinematógrafo Lumière, em 28 de dezembro de 1895. Seguem-se as desculpas embaraçadas de Louis.
Por fim, há o tempo da pura glória. A consagração da entrada na Academia de Ciências (Louis) e na Academia de Medicina (Auguste), 1919. E o momento em que pesquisadores (como Georges Sadoul) reconstituem a história dos primeiros anos do cinema, cotejando os negativos existentes, catálogos, informações publicadas pela imprensa na época e as próprias lembranças de Louis.
"Correspondances", que cobre o período de 1890 a 1953, é o romance de uma trajetória científica exemplar. Louis e Auguste Lumière estão para o século 20 um pouco como Colombo para a Idade Moderna. Compreenderam melhor para que lado girava a Terra, e pisaram no Novo Mundo.

Livro: Correspondances 1890-1953
Autores: Auguste et Louis Lumière
Onde encomendar: Livraria Francesa (r. Barão de Itapetininga, 275, tel 231-4555)
Quanto: 180 francos

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Sobre os cem anos do cinema à pág. 5-8

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