São Paulo, domingo, 8 de janeiro de 1995
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Ofídios Postais

MOACYR SCLIAR

Prezada esposa: anexo segue a surpresa que há muito tempo venho te prometendo. Tenho certeza de que você ficará encantada.
Outros presenteiam suas mulheres com cães, gatos, coelhos, estes animaizinhos comuns. Mas que eu saiba jamais marido algum pensou em jibóia. Nunca houve animal de estimação como este. E, ao contrário do que você pensa, não dá trabalho algum: basta você de vez em quando dar-lhe um boi.
Trabalho tive eu. Arranjar a jibóia até que não foi difícil. Não foi fácil conseguir um meio de mandá-la a você. Não quis recorrer ao serviço postal, pensei num meio alternativo, mas qual?
Um amigo me sugeriu pombo-correio, mas isto, claro, não poderia funcionar. Em primeiro lugar, não há pombo que suporte o peso de uma jibóia. Se eu usasse várias aves o esforço conjunto talvez desse conta do recado, mas eu não estaria seguro de que a jibóia não comeria os pombos no meio do caminho, e a queda das alturas que resultaria desta refeição aérea não faria bem ao ofídio. Desisti.
Depois pensei num portador. Estava disposto a pagar bom dinheiro a quem quisesse levá-la para você – mas não encontrei ninguém. Passei dias no aeroporto, falando com todo mundo, mas nada! Minha esperança cresceu ao saber de um hindu ia para aí.
Fui procurá-lo, esperando que fosse um encantador de serpentes. Mas não, era um professor universitário, convidado para um curso qualquer. O homem não apenas recusou, mas ficou ofendido: ele tem nojo de serpentes.
Não tendo outra solução, optei por enviar a jibóia pelo correio. Espero que chegue e que você goste. Um beijo.

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