São Paulo, domingo, 8 de janeiro de 1995
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O difícil é acreditar

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Este início de ano foi marcado por duas notícias bombásticas. A primeira diz respeito ao possível estouro das duas maiores instituições financeiras estaduais (Banespa e Banerj). A segunda refere-se à gula dos parlamentares ao desejarem aumentar seus vencimentos para mais de R$ 10 mil por mês.
As duas notícias envolveram o Congresso Nacional. No caso dos bancos, os senadores retardaram desnecessariamente a aprovação do nome do dr. Pérsio Arida para a presidência do Banco Central apesar de saberem tratar-se de uma crise de liquidez de alta periculosidade, o que exige a participação pessoal e direta do presidente do BC. Afinal, é ele que, em última análise, é responsável pelo saneamento daquelas instituições ou por sua eventual liquidação.
No caso dos vencimentos dos congressistas, isso ocorreu na hora precisa em que se descobriu que os caixas dos governos (federal e estaduais) estavam completamente arrasados a ponto de se parcelar os pagamentos ao funcionalismo público. Isso coincidiu ainda com o doloroso parto que resultou em um mísero abono de R$ 15 para os brasileiros que ganham menos.
No campo das finanças públicas, estamos diante de uma situação de extrema gravidade. Os principais devedores dos dois bancos são seus respectivos governos. Consta que a dívida de São Paulo chega à espantosa cifra de US$ 8,5 bilhões. Há quem diga que seja US$ 12 bilhões. É um montante fabuloso –cerca de 2,5% do PIB do Brasil.
Nos últimos meses, os dois bancos estavam se valendo da venda de títulos por um dia para obter recursos capazes de sustentar um equilíbrio instável. Os compradores, na sua maioria, eram os bancos privados. Mas, o risco se elevou tanto que estes bancos pararam de comprar os títulos estaduais, deixando um buraco a descoberto e levando o próprio Banco Central, numa conduta de emergência, a assumir o papel de comprador daqueles papéis. Portanto, foi o BC que ficou com o "mico" na mão. Isso atinge em cheio a nossa população por ter fortes reflexos negativos nas contas públicas e no Plano Real.
O mesmo ocorre com a generosa "alavancagem salarial" dos nossos parlamentares. A hora é das mais inoportunas. O governo federal se diz empenhado em promover o ajuste fiscal cortando despesas pois, até o momento, a criatividade dos nossos burocratas só conseguiu visualizar um equilíbrio através do aumento de impostos –o que também conspira contra a produção, o emprego, os salários e o combate à inflação.
Por isso, a lentidão dos senadores no caso do Banco Central e a destreza do Congresso Nacional em tentar aumentar os vencimentos de seus integrantes representaram dois "presentes de grego" para a nação como um todo. Estamos diante de um governo que conquistou, de partida, uma enorme credibilidade por parte da população brasileira por ter estabilizado a moeda e se comprometido a fazer o ajuste fiscal de modo definitivo.
É difícil acreditar que essa orquestração de ações noticiadas pela imprensa seja verdadeira. Só o tempo dirá.

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