São Paulo, quarta-feira, 11 de janeiro de 1995
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Drogas sem preconceito

Um recente estudo encomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), e publicado ontem por esta Folha, revelou um panorama assustador acerca do consumo de crack em São Paulo. Reitera com isso a necessidade de uma debate amplo e racional acerca do modo mais adequado de abordar o problema das drogas no país.
Segundo a pesquisa, o crack já foi experimentado por cerca de 35% dos meninos de rua da cidade e provoca dependência com menos de um mês de uso. Mesmo que tais dados devam ser vistos com cautela, sua ordem de grandeza basta para impressionar. Mais ainda, o trabalho revela que os usuários não têm dificuldade para obter a droga.
Essa situação soma-se à de outros estupefacientes para pôr em xeque a atual estratégia de combate às drogas. Mesmo os EUA, que gastam bilhões de dólares anuais nessa batalha, não têm obtido resultados expressivos seja na repressão ao tráfico, seja na queda do consumo.
A ministra da Saúde da França, Simone Veil, afirmou, em entrevista publicada segunda-feira pela Folha que cresce o debate sobre a descriminação do consumo de drogas leves naquele país. Mas há propostas mais ousadas, como a defendida, entre outros, pelo ultraliberal prêmio Nobel de Economia, Milton Friedman, de liberalização completa do comércio de entorpecentes.
O raciocínio compara o tratamento atual das drogas com a Lei Seca, que fracassou em proibir o consumo de álcool nos EUA do período entre-guerras e estimulou a criminalidade. A demanda é irreprimível, afirmam, e é melhor regular o setor do que jogar consumidores no mercado negro e assegurar aos traficantes grandes receitas e, com isso, enorme poder.
É evidente que a discussão tem muitos lados e o próprio potencial devastador dos entorpecentes sobre a vida humana exige sem dúvida séria consideração.
O que não se pode fazer é escamotear o problema, ou tentar minimizá-lo. A questão das drogas vem se agravando cada vez mais e quanto mais cedo for alvo de uma discussão corajosa, equilibrada e sem preconceitos, melhor.

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