São Paulo, sexta-feira, 13 de janeiro de 1995
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Clóvis está errado

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Clóvis Rossi escreve hoje, na coluna acima, um inteligentíssimo artigo, apontando incoerência na minha defesa à limitação da propaganda ao cigarro. Vindo de quem vem, a argumentação só pode estar baseada em princípios éticos. Por conhecê-lo há muitos anos, sei que é independente e não deve favor a qualquer tipo de grupo político e, muito menos, empresarial. Mas ele está errado.
Vou me ater ao ponto que considero essencial. Ele diz que "propaganda é, em essência, informação" e compara a publicidade ao jornalismo. No fundo, proibir a propaganda seria uma censura ao direito de informar. Discordo.
Todos sabem que o fumo compromete a saúde; só no Brasil, são 100 mil mortes por ano. A publicidade apresenta a nicotina como fonte de bem-estar, charme, sexualidade, sucesso. Não é informação: é enganação. Uma enganação especial –especial porque mata.
Sou, de fato, favorável a descriminar as drogas porque a repressão se mostra ineficaz. Duvido, porém, que o pai e avô Clóvis Rossi não pulassem da cadeira, indignados, caso aparecesse na TV alguém anunciando as maravilhas de se levar um pico ou fumar crack, relacionando-os ao desempenho esportivo e sexual. Isso é informação?
Não: é crime. Crime porque está lucrando com o vício de desesperados. E, ao mesmo tempo, produzindo mais desesperados. Se o crack, por exemplo, já cresce sem ajuda, imagine com uma campanha publicitária estimulando o consumo através de mentiras.
Como o alcoolismo é uma drama nacional, aceito a sugestão de Clóvis: os especialistas devem estudar as devidas limitações e advertências.
No dia em que eu me sentir no mesmo plano profissional de um publicitário que se orgulha em vender cigarros, vou procurar outro jeito de ganhar a vida.
PS – Uma das razões que bato duro no cigarro é puro egoísmo: é porque desejo ter algumas pessoas mais tempo a meu lado. Meu pai, por exemplo, vítima da degradação do vício, de quem aprendi a odiar o cigarro. E nessa lista coloco Clóvis –qualquer um que leia sua coluna, sabe de sua importância.

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