São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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Estudo genético comprova teoria sobre o isolamento do povo basco

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há 18 mil anos, os bascos constituem população distinta, como o demonstram provas arqueológicas, agora reforçadas por estudos genéticos. Eles atualmente habitam ambas as vertentes dos Pirineus ocidentais, ocupando vários departamentos do sudoeste da França e diversas províncias do norte da Espanha –as vascongadas. Os habitantes desta região somam mais de 1,7 milhão, muito mais populosa do lado espanhol. São muito conhecidos do público por seus frequentes movimentos separatistas.
Distinguem-se por falar uma língua toda especial, sem parentesco com nenhuma outra do mundo, e por terem cultura individualizada e solidariedade étcnica, não se cruzando fora de seu grupo. Supõe-se que descendem dos mais antigos povos do continente, anteriores à dominação indo-européia e que seu idioma tem raízes asiáticas. De seu ponto de origem, teriam migrado ao longo do Mediterrâneo oriental há uns 6.000 ou 7.000 anos (para alguns apenas 2.000) para seu reduto pirenaico, levando consigo suas técnicas agrícolas e industriais.
Sofreram efeitos da ocupação romana e, após o desmembramento do grande império, organizaram-se para resistir aos visigodos, aos francos, aos normandos e aos mouros. Aliás, foram eles e não os mouros que venceram Carlos Magno na batalha de Roncesvales. No século 19, conseguiram efêmera unidade (Reino de Navarra).
Dotados de espírito empreendedor e aventureiro, os bascos migraram desde a Antiguidade para outras regiões e, valentes guerreiros e navegadores, serviram como mercenários nos exércitos romanos e germânicos e participaram da colonização de várias partes da América do Sul, especialmente Venezuela. Pregaram também fora da Espanha como missionários, não se podendo omitir Inácio de Loyola e São Francisco Xavier. O nacionalismo dos bascos reflete-se na persistência de sua língua, única na Europa ocidental que não pertence ao grupo indo-europeu.
Os bascos são geneticamente distintos de todos os europeus. Revelam a maior frequência do tipo sanguíneo Rh negativo no mundo e baixa frequência do gene correspondente ao tipo B do sistema ABO. O DNA dos bascos foi recentemente pesquisado por Francesc Calafell e Jaune Bertranpetit, da Universidade de Barcelona ("American Journal of Biological Anthropology" 93, 201). Eles descobriram que os bascos têm muitas outras frequências distintas, porém na região por eles ocupada a frequência dos genes distintos praticamente não varia. Segundo os autores, isto sugere que a população basca se moveu nos Pirineus, mantendo-se todavia isolada do resto do mundo, pelo menos até recentemente.
Pensam Calafell e Bertranpetit que os bascos atuais descendem de uma antiga população que se tornou isolada no auge da última Idade Glacial e se manteve deve então intocada genetica e linguisticamente. Abundante material arqueológico, inclusive pinturas em cavernas, indica que no fim da última Idade Glacial (20,3 a 16,5 mil anos) houve aumento populacional que depois se estabilizou.
Em outro artigo ("Current Anthropology", 34, 735) os mesmos pesquisadores salientam que as barreiras geográficas não podem, sozinhas, explicar por que os bascos não se cruzaram com outras populações. Nesse processo de manutenção de identidade genética devem ter influído outros mecanismos culturais, como, por exemplo, a linguagem.

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