São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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Fim do vestibular

A proposta do ministro da Educação, Paulo Renato Souza, de tentar substituir os atuais vestibulares por uma série de exames nacionais a serem feitos durante o segundo grau é bastante interessante e merece uma análise mais cuidadosa.
Em que pese a falta de detalhamento do projeto, é importante que todos os setores que de alguma forma estejam ligados à educação se manifestem desde já, trazendo sugestões e levantando objeções que enriqueçam o debate.
São muito poucos os que defenderão o atual modelo de ingresso nas universidades como o ideal. Os vestibulares acabaram se tornando como que um fim em si mesmo e não mais uma etapa da longa rota de aprendizado do aluno.
Os concursos para ingresso na universidade acabaram gerando uma aberração: os chamados cursinhos. Verdadeiras máquinas de fabricar dinheiro para os seus proprietários, essas instituições transmitem uma forma "sui generis" de conhecimento: o conhecimento de como fazer uma prova de vestibular, e nada ou muito pouco mais.
No final, acabam sendo aprovados nas melhores universidades (em geral, as públicas) as pessoas que frequentaram os bons colégios particulares ou que tiveram recursos para pagar um desses cursinhos. O aluno da rede pública no mais das vezes tem de se conformar em não ir para a universidade ou então frequentar uma das muitas arapucas que lhe cobrará muito e ensinará pouco.
Não há dúvida de que é preciso reformular esse esquema profundamente injusto e a proposta do ministro da Educação pode ser um bom ponto de partida. Uma das vantagens da proposta de Paulo Renato Souza é que ela dilui no tempo toda a carga que hoje pesa sobre o vestibular, tornando-o menos fatal. Ela tende ainda a diminuir a aberração dos cursinhos.
Também é positiva a perspectiva de que se venha a ter uma avaliação nacional e homogênea de todos os alunos de segundo grau do país. Essa avaliação, para além de facilitar a forma de selecionar quem vai para qual universidade, permitiria a cada comunidade ter um parâmetro para cobrar eficiência das escolas sejam elas particulares ou públicas. Se toda uma turma de um dado colégio obtiver baixas notas nos exames, ficará evidente que há algo de errado com a instituição e os pais, alunos e autoridades poderão cobrar soluções.
De outro lado, a idéia do ministro também suscita dúvidas. É óbvio que operacionalizar esses exames em nível nacional é um grande problema. Implica custos, abre a perspectiva para todo tipo de fraude e pode acabar resultando numa mera troca de seis por meia dúzia.
Para que isso não ocorra, é preciso evitar que se repita, nos exames nacionais, o erro de concepção muito frequente nos concursos vestibulares, que procuram avaliar quase que exclusivamente o grau de conhecimento acumulado do aluno e como que ignoram a sua capacidade de aprendizado.
De resto, é preciso ter em mente que o vestibular está longe de ser o principal problema da educação nacional. Se não forem tomadas vigorosas medidas para sanear e tornar eficiente o ensino público, sobretudo o básico, o novo governo pode dar adeus a todas as suas pretensões de tornar o Brasil um país um bocadinho melhor.

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