São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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Um quarteto do barulho

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

A linguagem dos governantes é cheia de modismos. Governabilidade, alavancagem, ancoragem, securitização, rolagem, saneamento econômico são exemplos de expressões introduzidas nos últimos anos pelo dicionário do "governês". Surgiu agora o tal do "Custo Brasil" contra o qual o governo se propõe a lutar.
Nesta época em que reduzir custos é essencial, só se pode elogiar essa intenção governamental. Ótimo! Parabéns! O que não se entende, porém, é que esse mesmo governo que se propõe a combater o Custo Brasil apresente à nação um pacote tributário que grava ainda mais os que pagam impostos. Como reduzir o Custo Brasil se os impostos aumentam os custos?
Essa lógica está por ser entendida. Todos estão cansados de saber que, neste país, alguns pagam muito e a maioria paga pouco –ou nada. Para os que cumprem a lei religiosamente, a carga é gigantesca. Só de impostos, uma empresa brasileira recolhe, em média, 20% do seu faturamento. De encargos sociais, ela paga 102% sobre a folha de salários, o que dá uns 15% sobre o faturamento.
Além disso, há a obscena taxa de juros, que aqui chega a 35% ao ano –em termos reais– enquanto que nos países adiantados ela não passa de 10%, com carência e prazos substancialmente maiores do que os nossos. Numa empresa pouco endividada e que utiliza empréstimos só para financiar o seu capital de giro, isso representa mais uns 5% do faturamento.
Para o leitor que está somando, isso já chegou a 40%. Ao somarmos os impostos indiretos, as taxas e vários outros penduricalhos, a conta ultrapassa os 50%. E não pára aí. Para as empresas que exportam, os custos portuários em Santos ou no Rio de Janeiro são quatro vezes maiores do que os de Nova York ou Roterdã. Os únicos portos que se equiparam com os internacionais são os de Itaqui (Maranhão) e Aracaju (Sergipe) –porque são administrados diretamente por empresas estatais eficientes e não pelas corporações portuárias que insistem na prática da reserva de mercado e do monopólio sindical.
Quando nos pomos a fazer todos esses cálculos, vemos que o tal Custo Brasil é muito alto mesmo. Se entrarmos no campo da qualidade dos benefícios, então, a coisa se mostra realmente inviável. Vejam, por exemplo, a questão dos encargos sociais. Apesar de encargos compulsórios serem altíssimos, os benefícios são precários e inaceitáveis por uma boa parcela dos nossos trabalhadores –o que leva as empresas a terem despesas adicionais com saúde, alimentação, transporte e vários outros serviços sociais.
Por isso, o governo federal me parece estar na direção certa na sua intenção de reduzir o Custo Brasil. Mas precisa reconsiderar essa idéia de impor, neste momento, uma sobrecarga tributária que eleva ainda mais aquele custo. O governo que tem déficits pela frente precisa se policiar e encurtar a distância que separa as intenções virtuosas das ações predatórias reduzindo, de uma vez por todas, a sobrecarga desse maléfico quarteto: impostos, juros, encargos sociais e custos portuários.

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