São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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MADONNA ALÉM DA LIBIDO

-Não é cansativo ouvir sempre as mesmas perguntas e responder sempre as mesmas coisas?
-É. Quando um jornalista faz perguntas estúpidas, me divirto à custa dele. Invento histórias. Mas acontece que vocês não me escutam. Já vêm com suas próprias idéias, já sabem o que vão falar de mim. Diga eu o que disser, dá no mesmo.
-Mas a opinião dos outros não parece afetá-la. Se você faz provocações, recebe críticas. Se não provoca, criticam também.
-Sim. Se provoco, dizem: "Por que você não vira uma boa moça, canta boas músicas e pára com essa história?" Então, quando decido fazer isso, falam que mudei minha imagem.
-Você se refere aos críticos ou ao público?
-Aos críticos, aos jornalistas. À mídia, ou como quer que se chame. Até entendo que escrevam o que escrevem para vender jornal. Minha vida dá boas manchetes, eu sei. Mas muitas vezes o que se lê sobre mim é invenção completa.
-Invenção?
-Sim, o público acredita em qualquer coisa sobre Madonna, mesmo sendo mentira. Este é o jogo. Graças a Deus, tenho senso de humor. Se não, já teria metralhado muita gente.
–E não é cansativo falar tanto de si mesma?
–Às vezes, na metade da entrevista, paro para pensar porque falo tanto de mim. É um absurdo, embora eu aceite essa exigência comercial do meu trabalho artístico. Mas tomo muito cuidado, porque o que disser me acompanhará o resto da vida.
-Isso aconteceu quando David Letterman a entrevistou em seu talk-show? Você estava brava e falou "foder" três vezes.
-Os roteiristas de Letterman me aconselharam a provocá-lo, a insultá-lo, a esquentar o ambiente. Queriam que eu fosse estúpida e me divertisse no programa de maior audiência nos Estados Unidos. Eu topei. Mas Letterman ignorava até onde eu era capaz de chegar. Ele é um homem muito bom para humilhar as pessoas, mas não conseguiu comigo. Depois, disse que me comportei mal. Falava de mim todos os dias. Ficou obcecado.
–Como terminou esta história?
–Liguei para ele e disse para esquecermos tudo isso. Sabe o que ele respondeu? Que não havia nada para ser esquecido.
-Você se dá bem com a ambiguidade em geral. Por quê?
-É a luta de minha vida. Fui educada na religião católica, numa sociedade patriarcal, num mundo que cultiva o fanatismo. Mas eu consigo ver o outro lado. Quero deixar claro em meu trabalho que se deve ter a mente aberta. Deve-se permitir que os outros tenham seus pontos de vista. Sem imposição, sem medo.
–Você foi reprimida?
–Desde cedo. Meu trabalho mostra esta luta contra a repressão. É uma catarse. Meu livro "Sex", por exemplo, é o ajuste de contas entre o que eu sou e o que fui quando meu pai me educou. Ele me fazia acreditar que as mulheres não podem falar de suas fantasias sexuais. Até que um dia eu perguntei: por quê?
–E o que ele respondeu?
–"Porque sim. Porque eu disse".

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