São Paulo, quinta-feira, 19 de janeiro de 1995
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Na surdina

Enquanto alguns aumentos de impostos passam pelo Congresso envoltos em grande discussão, outros surgem sorrateiros, furtivos, como um fato consumado na vida dos cidadãos.
É o caso do IPVA de 1995 cobrado no Estado de São Paulo. Dados apresentados ontem por esta Folha mostram que a majoração real imposta aos paulistas na média de uma amostra de seis modelos foi de 93%. Em alguns casos, a variação chegou até a assustadores 186%.
O governo credita a absurda elevação ao método de cálculo do tributo, mas ressalta que, no caso dos importados, o imposto caiu. Como se isso fosse algum consolo para a esmagadora maioria que possui carros nacionais. Como se essa distorção não servisse apenas para acirrar as disparidades de renda no país em vez de contribuir para atenuá-la, a razão de ser mesma do sistema tributário.
E, caso a metodologia, por alguma tecnicalidade qualquer, resulte em ônus excessivo, extorsivo para o contribuinte –como é o caso– é dever da autoridade corrigi-la. Afinal, a finalidade do Estado é servir à população, não extorquir dela, de forma mesquinha, o máximo que os meandros da lei possam eventualmente permitir.
Mais ainda, o momento, não apenas no país como no mundo todo, é de repensar a estrutura do Estado, racionalizando-o e buscando a máxima eficiência –ou seja, fazendo mais sem drenar novos recursos da sociedade. O governo de São Paulo, porém, caracterizou-se nos últimos tempos por um solene desprezo quanto a medidas de austeridade, além de não apresentar avanços significativos nas suas prestações à sociedade. Não tem portanto qualquer legitimidade para novos avanços ao bolso do contribuinte.
O episódio de todo modo vem expor a distorção que se cristalizou em boa parte do poder público brasileiro nas últimas décadas e que está a exigir uma mudança urgente e radical. Ele é paquidérmico, irritantemente lento para oferecer melhores serviços ou mostrar mais eficiência no trato dos recursos da sociedade. Mas é surpreendentemente ágil ao escorchar o contribuinte com aumentos de tributos. Uma agilidade que desconhece mesmo o escrúpulo de fazê-lo sem ter rigorosamente nada para mostrar que o justifique.

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