São Paulo, terça-feira, 24 de janeiro de 1995
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Imagem milagrosa

JANIO DE FREITAS

A meia marcha à ré do governo, pondo em discussão a conveniência de conceder meio reajuste do salário mínimo (R$ 15 dos R$ 30 aprovados pelos parlamentares), põe em questão mais do que a imagem popular do presidente Fernando Henrique, cuja preservação é invocada pela proposta de reconsideração do veto por ele anunciado.
Ou o governo tem política salarial definida pela política econômica ou não tem, e em lugar de uma e de outra tem a suposta imagem do presidente. Se tem política salarial e em função dela comunicou o veto ao reajuste, tão logo os parlamentares acabaram de aprová-lo, a simples admissão do meio aumento suscita mais e piores dúvidas.
Por coincidência, o abono a ser pago só em janeiro, de R$ 15 para cada assalariado do mínimo, é igual à metade do reajuste aprovado, que elevara o mínimo de R$ 70 para R$ 100. A proposta que evitaria o presumido desgaste de Fernando Henrique, caso vete o reajuste depois do acordo em que seus vencimentos foram aumentados em 163%, é de incorporação do abono. A proposta invoca ainda a vantagem de que evitaria a contestação total a uma decisão parlamentar.
Mas se é possível, para preservar a imagem de Fernando Henrique, reajustar o salário mínimo em R$ 15, torna-se incompreensível que não fosse aceito o mesmo reajuste a partir de janeiro, sendo admitido apenas o abono por um só mês. Foi alegado então que a Previdência, obrigada a repassar aos benefícios e pensões os reajustes do mínimo, não tinha condições de absorver os R$ 15. Pelo visto, as conveniências para a imagem do presidente não favorecem só a ele: também dotam o cofre da Previdência daquilo que até há pouco não havia de onde tirar. É uma nova imagem milagrosa, ameaçando dividir as romarias com a de Aparecida.

Exceção
Em cogitação inicial no governo, a transferência da Diretoria de Aviação Civil-DAC, do Ministério da Aeronáutica para o dos Transportes, já provoca reações militares negativas. Mas teria toda a lógica administrativa, tanto no que se refere à organização do governo, como no que se refere à aviação civil.
Não tem cabimento que um ministério militar se ocupe de preços de passagens aéreas e de outros assuntos estritamente comerciais e privados. O Brasil, com o DAC militarizado, é uma exceção entre os países que têm aviação civil moderna. Exceção que, se por acaso foi justificável na origem do DAC, há décadas deixou de sê-lo. E só permaneceu porque, acima da racionalidade, as pressões à maneira militar acovardaram os sucessivos governos que em algum momento pensaram em desfazer a deformação.

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