São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 1995
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Khouri descobre prazer do replay

CAROLINA CHAGAS
DA REPORTAGEM LOCAL

A primeira relação do cineasta Walter Hugo Khouri, 65, com o vídeo foi de ódio absoluto.
"A composição de meus filmes telecinados ficou tão deformada que quase não os reconheci", lembra, referindo-se às cópias dos anos 80 com telecine (aparelho que permite a transmissão por TV de filmes feitos para o cinema) das fitas rodadas na década de 60 em preto-e-branco, "Noite Vazia", "O Corpo Ardente" e "As Amorosas".
Com uma videoteca particular com cerca de 150 clássicos do cinema mundial (conheça alguns deles em quadro ao lado) e alguns filmes de jazz, Khouri tomou gosto pelo vídeo.
"É uma comodidade poder sentar diante da televisão e repetir seis vezes uma sequência de Irène Jacob em 'A Dupla Vida de Veronique', de Kieslowski", diz.
Na poltrona de gobelin avermelhado de sua espaçosa cobertura no centro de São Paulo –que serviu de locação da fita "O Desejo"–, Khouri confessa ter redescoberto cenas memoráveis de filmes como "A Aventura", de Michelangelo Antonioni, "Noites de Circo", de Ingmar Bergman, ou "Elisa, Minha Vida", de Carlos Saura.
"Hoje, compreendo que o vídeo garante a sobrevivência dos trabalhos dos artistas cinematográficos", diz. "É das poucas chances que as novas gerações têm de ter contato com os nossos trabalhos."
Parte das cópias que tem em seu acervo particular, Khouri conseguiu durante os 45 dias que passou em 93 coordenando um "workshop" de cinema em Havana.
"A videoteca da Universidade de Havana tem uma quantidade enorme de fitas raras que eles reproduzem via satélite", conta. "Foi lá que eu consegui uma cópia de 'Flor de Equinócio', de Yasujiro Ozu, um de meus diretores favoritos, ao lado de Ingmar Bergman, Michelangelo Antonioni e Joseph von Sternberg". Do cineasta alemão, Khouri destaca principalmente seus filmes com Marlene Dietrich.
Sempre que quer assistir a um filme que não tem em casa, Khouri dirige por cerca de 20 minutos até a 2001 da avenida Cidade Jardim (zona oeste de São Paulo).
"É das poucas locadoras com a preocupação de oferecer aos clientes um arquivo de qualidade", analisa. "Com filmes nacionais e de arte que ultrapassam as opções das fitas de espetáculo impostas pelas grandes distribuidoras."
Nos próximos dias, o cineasta pretende cumprir o trajeto para recuperar os filmes que deixou de ver enquanto estava ocupado com a filmagem de "As Feras" –a ser lançado ainda este semestre.
"Estou planejando pegar umas dez fitas dia desses e não sair de casa antes de ver todas", afirma.
"A Igualdade é Branca", "A Última Tempestade", "O Céu que nos Protege" e "Maridos e Esposas" são alguns dos itens da lista de quase 15 fitas rabiscada em cima do calendário de um talonário de cheques. "E ainda vou rever 'Solaris', o filme de Tarkovski que falta em minha videoteca."

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