São Paulo, domingo, 29 de janeiro de 1995
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Esquizofrenia marca a nova crise mundial

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A economia mundial sofre de esquizofrenia –o que se conhece em economês como "bolha financeira". Ela corresponde a uma cisão, que cresce com o tempo, entre o valor corrente de um ativo e seu valor dito "fundamental".
É o fenômeno mais corriqueiro nos mercados cambiais, por exemplo, quando se diz que uma dada taxa de câmbio e os "fundamentos" da economia não coincidem.
Nas Bolsas, cotidianamente se tenta estimar o desvio dos valores correntes frente ao que se considera os fundamentos da valorização de uma ação. Um dos mais importantes teóricos sobre câmbio, o sueco Lars Svenssen, alerta para as dificuldades de diferenciar o especulativo do fundamental.
Conclusão: há um campo significativo, no cerne da política econômica, que é arbitrário. Como é arbitrária a aposta de um "trader" numa mesa de câmbio ou de papéis de dívida externa de países em desenvolvimento.
Quando a autoridade econômica diz que não importa o câmbio, mas a redução do "custo Brasil", não está provando seu ponto, mas sugerindo um caminho rumo ao equilíbrio mais permanente. É uma aposta com o destino do país.
Reduzir o "custo Brasil" e aceitar o atual nível de câmbio não é, portanto, algo que se deduza de um teorema. Toda política econômica é, por definição, uma aposta.
A aposta mexicana mostrou-se dolorosa. Serviu também para pôr no tabuleiro político das chamadas grandes nações um princípio de integração com o Sul mais objetivo. Afinal, em 82 não havia Nafta.
O Nafta não resolve os problemas financeiros nem elimina a necessidade de ajustes. Mas o México fica mais parecido com a Califórnia, que acaba de quebrar.
É revelador da jequice da nossa imprensa e intelectualidade que tanta celeuma se faça em torno do México, esquecendo que ali ao lado há uma falência de fazer corar o interventor do Banespa.
A indústria de fundos nos EUA sofreu em 1994 abalos tão aterradores quanto os sofridos pelos "cucarachas". A nova vedete do momento são as operações conhecidas como "derivatives".
Foi um dos temas mais calorosos da última gestão do Congresso dos EUA e causa de mais de uma bancarrota empresarial, não apenas naquele país (ficou célebre o caso da MetallGesellschaft alemã).
A elevação da taxa de juros nos EUA foi a causa fundamental desses furacões –também na Ásia, onde a China começa a ganhar fama de menina mal-educada. O "custo China" está aumentando.
Aliás, seria interessante alguém, ou o governo, passar a medir de forma objetiva e transparente o tal "custo Brasil", colocando-o lado a lado com medidas análogas de outros países.
Pois, afinal, há também "custo Argentina", "custo Chile" e outros. O maior desafio é distinguir o valor corrente especulativo daquele que se pode considerar fundamental, porque é legítimo.
É necessária uma política industrial, e ela custa caro. Esse foi outro debate do início do governo Clinton. Afinal, não existiria IBM sem o Pentágono e a Nasa.
A Califórnia era o Estado com maior concentração de bases do complexo industrial-militar. Foi vítima não apenas de "derivatives", mas também da incapacidade de se reciclar estruturalmente depois do fim da Guerra Fria.

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