São Paulo, segunda-feira, 2 de outubro de 1995
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Livro reúne teatro inédito de Vinicius

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Chega ao mercado a partir desta quinta-feira o livro com as obras para teatro do poeta carioca Vinicius de Moraes (1913-1980).
O volume se intitula ``Teatro em Versos" e dá continuidade ao projeto de edição das obras completas do escritor pela Companhia das Letras. A organização e os textos do volume são do crítico de cinema Carlos Auguto Calil.
Vinicius foi um dramaturgo fortuito. Mas o pouco que produziu no gênero demonstra a vontade de estabelecer uma tradição brasileira de musical que fugisse ao modelo do teatro de revista. Vontade, aliás, não vingada até hoje.
Sua única peça de sucesso foi ``Orfeu da Conceição", em parceria com o maestro Tom Jobim (1927-1994). A peça ejetou Tom e Vinicius ao estrelato da música popular brasileira.
Vinicius via na dramaturgia um prolongamento do ofício de poeta. A maior parte de sua peças é construída em versos, com alta voltagem lírica e melodramática. A imaginação do autor se dividia entre o erotismo e a culpa. ``Seu teatro revela um ser melancólico, marcado pela dimensão trágica, diferente da imagem pública de poetinha", analisa Calil.
``Teatro em Versos" soma a essas obras duas peças inéditas e uma dezena de planos interrompidos. Traz também desenhos, cenários e fotografias.
Inéditas são ``As Feras (Chacina em Barros Filho)" e ``Pobre Menina Rica". A primeira recebeu o subtítulo de ``Tragédia pau-de-arara" quando foi escrita, em 1961, tinha pretensões sociais e nunca foi representada. Calil considera essa obra uma revelação: ``Representa a mais completa empreitada do poeta no sentido de criar uma dramaturgia própria."
``Pobre Menina Rica" tampouco chegou a virar livro. Permaneceu incompleta. Parte dela, o ``Trailer", foi mostrada em show com o compositor Carlos Lyra e a cantora Nara Leão, na boate Au Bon Gourmet, em 1963. Vinicius se baseou numa série de músicas que lhe deu para ouvir Carlos Lyra, como a faixa-título e ``Maria-Moita".
``Vinicius pensava nessa peça como um musical de dimensão dos da Broadway", diz Calil. O organizador teve problemas para estabelecer os textos. Comparou, por exemplo, os de ``Procura-se uma Rosa" e percebeu que o final do manuscrito diferia muito do publicado. O jornalista é pintado com cores mais tenebrosas no original.
Outra dificuldade residiu em distinguir o texto original das emendas feitas posteriormente por Carlos Lyra, Kate Lyra e Domingos de Oliveira. ``Depois de muito trabalho, acho que cheguei ao texto original", jura o organizador.
Em ``As Feras", Vinicius enxertou um coro e mudou o final à mão. Segundo Calil, o ``poetinha" não tinha método. ``Era de inspiração rápida. Escrevia de enfiada, à mão, em folhas de almaço. Pedia então para alguém datilografar. Depois corrigia novamente à mão, acrescentando trechos inteiros."
Entre os projetos incompletos Calil destaca ``Blimp, as Aventuras de um Playboy Marciano na Terra". Vinicius e Tom começaram a trabalhar na peça. Fizeram uma canção que era, nas palavras do poeta, um ``cartão de visitas sobre a sensualidade tropical dirigido a um extraterrestre". Título da música: ``Garota de Ipanema". ``A leitura dos manuscritos mostra que a música era para ser cantada por um marciano", afirma Calil.
Para o crítico, o teatro de Vinicius não frutificou por causa do êxito de sua vida boêmia e musical. Se tivesse continuado, a MPB poderia adquirir uma cultura de musicais bem-produzidos, mas perderia um pedaço essencial da Bossa Nova.

Livro: Teatro em Versos
Autor: Vinicius de Moraes
Lançamento: Companhia das Letras, 261 págs.
Quanto: R$ 20

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