São Paulo, sexta-feira, 6 de outubro de 1995
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Seamus Heaney ganha o Prêmio Nobel

NELSON ASCHER
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O novo Nobel de Literatura, Seamus Heaney (pronuncia-se, salvo engano, ``Chêimus Hínei") é irlandês e, como católico do Ulster (a Irlanda do Norte pertencente à Inglaterra e majoritariamente protestante), ele provavelmente o é em dobro.
Na Irlanda medieval onde se falava ainda o gaélico, os poetas eram artesãos que, como os outros, aprendiam longamente seu ofício e guardavam-lhe zelosamente os segredos em suas próprias guildas. Como observa o crítico Seamus Deane, os dois primeiros livros de Heaney, publicados nos anos 60, falam obsessivamente de profissões arcaicas ou extintas, chamando naturalmente a atenção para a sua própria, ou seja, a poesia -atividade que, para um discípulo declarado de Gerard Manley Hopkins, o jesuíta inglês que se fixou em Dublin, é essencialmente antiga, artesanal, virtuosística. O tom dessas coletâneas é elegíaco e lamenta a extinção de um mundo antigo sem esquecer, no entanto, que este era também o ambiente de catástrofes inomináveis, como a grande fome de meados do século passado, quando pereceu 1/3 da população do país.
É só nas suas publicações seguintes que a política imediata se fará sentir e isso acontece ao mesmo tempo que os problemas eclodem na região sob a forma de conflitos entre as duas comunidades nacionais ou confessionais. ``Wintering Out", seu livro que (recorrendo cada vez mais aos velhos mitos nacionais) reflete a/sobre a violência é de 1972, ano do colapso geral do acordo que garantiu durante meio século alguma paz local, ano também do ``Bloody Sunday" (domingo sangrento).
Heaney, nascido em 1939 no condado de Derry na Irlanda do Norte, numa família rural, estudou na Queen's University de Belfast, cidade onde ensinou até 72, quando se mudou para a República da Irlanda. A partir de 82, ele tem dividido seu tempo entre esse país e os Estados Unidos, ensinando em Harvard. Sua indicação ao Nobel não é nova e já em 1989 era considerado candidato favorito.
O poeta é o quarto irlandês a ganhar o prêmio, algo que torna esse país o campeão internacional em laureações per capita. Seus antecessores são George Bernard Shaw, William Butler Yeats e Samuel Becket. Entre os irlandeses esquecidos pelos suecos está ninguém menos que James Joyce, o que evidencia mais uma vez a estranha propensão dos escritores de língua inglesa -de Jonathan Swift e Laurence Sterne em diante- a nascerem na ilha em questão.
Heaney é, além disso, apenas um entre os vários bons poetas irlandeses atuais, algo que também indica que o que o americano Hugh Kenner chamou de a ``terceira província" da língua inglesa é não raro um lugar literariamente mais interessante que sua combatida vizinha maior.

Indicações de leitura: ``Seamus Heaney Selected Poems, 1965-75", Faber & Faber, London; ``Seamus Heaney Selected Poems 1966-87", Farrar, Straus and Giroux, NY; ``Preocupations - Selected Prose 1968-78", F., S. and Giroux, NY.

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