São Paulo, segunda-feira, 16 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Deus recicla; o diabo incinera

EDUARDO JORGE; ADRIANO DIOGO

EDUARDO JORGE e ADRIANO DIOGO
As dioxinas e os furanos são substâncias químicas formadas quando se queimam produtos orgânicos (que têm carbono) e substâncias que contenham cloro. Os maiores produtores dessas substâncias são os incineradores de lixo orgânico e os de lixo hospitalar. O Brasil não tem laboratórios para analisar essas substâncias.
Em 1985, a Agência de Proteção ao Meio Ambiente dos EUA -EPA- concluiu que essas substâncias causavam câncer em animais de laboratório. Na época, houve muita controvérsia quanto à possibilidade de elas também causarem câncer em seres humanos. Atualmente sabe-se que sim.
E como agem as dioxinas e furanos? Elas entram no corpo de três maneiras: pela pele, pela respiração e pelo estômago, quando comemos alimentos contaminados com eles. No sangue, eles se unem a uma proteína chamada AH, que permite que entrem nas células e modifiquem seu DNA.
Dentro do núcleo das células, também estão os receptores de hormônios esteróides, e as dioxinas e furanos também se ligam a eles. Isso quer dizer que basicamente essas substâncias têm duas maneiras de ação: alteram o crescimento e a estrutura das células, criando câncer; são reconhecidas pelo organismo como se fossem hormônios -por isso, elas fazem parte de um grupo chamado "hormônios ambientais".
A partir destas ações, as dioxinas e furanos causam: cloroacne (alterações do sistema imunológico, maior facilidade de ter infecções); alterações neurológicas (dores de cabeça, irritabilidade, alterações da memória, tremores); defeitos congênitos (diminuição do peso ao nascimento, diminuição dos genitais, hipotiroidismo, intersexo, morte fetal); alterações hormonais (diminuição do número de espermatozóides, atrofia testicular e alterações na estrutura testicular, aparecimento de mamas nos homens, infertilidade); câncer no fígado, timo, medula óssea, tireóide, mama, linfático e tecidos moles.
O mais grave e preocupante é que as dioxinas e furanos são substâncias estáveis na atmosfera. Só uma pequena parte é degradada. Se um animal ingerir vegetais contaminados por dioxinas, elas ficam no seu corpo; o homem que se alimentar da carne desse animal vai ser contaminado também. Tanto os homens como os animais não conseguem degradá-las.
Apesar dos valores mínimos aceitáveis fixados por diversas associações de saúde na ingestão diária, há evidências fortes de que não há nível seguro de exposição às dioxinas, porque uma única molécula contaminada pode desencadear as alterações que expusemos aqui.

EDUARDO JORGE, 45, médico sanitarista, é deputado federal pelo PT de São Paulo. ADRIANO DIOGO, 46, geólogo, é vereador pelo PT em São Paulo.

Texto Anterior: Teologia federal
Próximo Texto: Acidentes nas estradas são recorde do ano
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.