São Paulo, segunda-feira, 16 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Apostando no caos

VALDO CRUZ

BRASÍLIA - Em agosto, o governo apresentava oficialmente a governadores a sua proposta de reforma administrativa. Diante da reação positiva, o presidente Fernando Henrique Cardoso e seus ministros comemoraram: a aprovação do texto estava garantida.
No Congresso, o deputado Francisco Dornelles parecia uma voz no deserto. Confidenciava a amigos que aquela euforia toda não passava de fantasia. O governo estava negociando com a platéia errada.
Dornelles antecipava que a reforma administrativa emperraria no Congresso. Motivo: deputados e senadores, aqueles que darão o sim ou o não ao projeto, têm muitos amigos e eleitores trabalhando no serviço público.
Um ingrediente a mais: 1995 é véspera de eleição municipal, o primeiro passo para a sucessão presidencial. Num ambiente como esse, fala muito mais alto o interesse particular. Ninguém está interessado em comprar briga com seus eleitores.
Agora, ao se aproximar a votação da proposta, o governo percebe que errou ao privilegiar governadores e esquecer os parlamentares na hora de negociar o fim da estabilidade do funcionalismo público.
FHC e seus auxiliares descobriram que os governadores têm muito mais inimigos do que aliados dentro do Congresso Nacional. Ainda mais quando o assunto é demitir funcionário público.
Em São Paulo, por exemplo, parlamentares ligados a Orestes Quércia e Fleury não estão interessados em ajudar o governador Mário Covas. Dizem que o tucano, na hora de demitir, vai mirar a sua caneta nos funcionários nomeados pelos dois ex-governadores.
O mesmo acontece país afora. Em Pernambuco, adversários de Miguel Arraes dizem que o governador vai optar pela demissão dos eleitores -quero dizer, dos servidores- empregados durante o governo de seu antecessor, o pefelista Joaquim Francisco.
Enquanto deputados e senadores colocam seus interesses eleitorais em primeiro lugar, os governos estaduais caminham a passos largos para a bancarrota. Tem Estado que não dispõe de recursos nem para pagar o salário do funcionalismo.
Ao negar a governadores o direito de reduzir os gastos com pessoal, os parlamentares parecem apostar no caos para derrotar o ``inimigo". Quando conquistarem a vitória, pode não existir mais Estado para administrar.

Texto Anterior: Watters e Mirândola
Próximo Texto: Idolatria e veneração
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.