São Paulo, terça-feira, 17 de outubro de 1995
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O câmbio e as taxas de juros

IGOR CORNELSEN

Os diretores do Banco Central e o ministro Malan passaram os últimos dias fazendo proselitismo em favor da política de taxas de juros e da taxa de câmbio implementadas pelo Banco Central desde a introdução do Real.
O Plano Real é, sem dúvida, um sucesso; o ministro Malan e a equipe econômica devem se consolidar no poder, para aumentar a credibilidade do Brasil e de sua economia junto aos investidores privados brasileiros e estrangeiros, a fim de que o Brasil volte à rota dos investimentos produtivos.
Sou dos que acreditam que o Brasil deve ter taxas de juros bem superiores às dos países desenvolvidos, pois tem um passado recente de descontrole fiscal, inflação absurdamente elevada e calotes que não ajudam a atrair e reter poupança a custos mais baixos.
Só o tempo poderá mostrar aos poupadores nacionais e estrangeiros que o comportamento do Brasil mudou para, então, nos qualificarmos para remunerar poupadores a taxas mais civilizadas.
A dosagem, porém, dos juros no Brasil tem sido inadequada. Atualmente, eles têm contribuído para elevar o desequilíbrio fiscal do setor público, enfraquecer empresas nacionais viáveis -e, por consequência, o sistema bancário- e fragilizar politicamente a equipe econômica. Os juros, nos níveis em que estão, tornam vulneráveis a diretoria do BC e o ministro Malan, desnecessariamente.
A taxa de câmbio, por outro lado, é sustentável. Principalmente se forem mantidas as taxas de juros no nível em que têm estado ultimamente -quem é que não gosta de ganhar mais de 2% ao mês em dólares, com um nível baixo de risco a curto prazo?
Mas, certamente, existem outras alternativas que permitiriam ao mercado brasileiro estar muito mais aberto à concorrência internacional e, portanto, com produtos a custos mais baixos para consumidores e empresários brasileiros.
Ao mesmo tempo, isso tornaria o Brasil menos vulnerável a críticas no âmbito da Organização Mundial do Comércio, menos vulnerável a retaliações comerciais e se colocando em posição agressiva para ampliar sua participação nos mercados dos países desenvolvidos, exigindo reciprocidade por parte de sua abertura comercial unilateral.
Não é segredo que os altos custos da mão-de-obra, bem como a valorização do marco e do iene, tornam Alemanha e Japão exportadores de fábricas para regiões onde se pode produzir a custo mais baixo. Pelo tamanho do mercado e pela disponibilidade de descendentes de alemães e japoneses, o Brasil candidata-se a ser um natural receptor da migração dessas fábricas, principalmente indústria elétrica, eletrônica e automobilística.
Um real mais competitivo certamente seria um fator importantíssimo na atração de indústrias voltadas aos mercados internacionais. O real valorizado e a economia fechada só ajudam, entretanto, a atrair indústrias voltadas para o Mercosul.
É um mito achar que o câmbio tenha tanta influência na taxa de inflação. Economias muito mais abertas que a do Brasil, como a italiana e a inglesa, tiveram desvalorização de suas moedas por ocasião da saída da serpente de moedas da Europa nesta década, desvalorizando-se também acentuadamente em relação ao iene e ao dólar. Para surpresa dos analistas econômicos, não houve grande impacto inflacionário e ambas as economias terão, em 95, taxas de inflação muito baixas.
O México, que teve desvalorização do peso superior a 100% no final de 94, entrou em crise de liquidez que desarranjou suprimentos e tornou escassas algumas matérias-primas. Passados seis meses, a inflação caiu para 2% ao mês, sendo provável que fique abaixo de 15% ao ano já em 96.
Não acredito que uma desvalorização do real um pouco mais acentuada tenha grande impacto no nível de inflação. Pelo contrário, permitirá uma maior abertura econômica, que trará maior concorrência, dará confiança para o aumento dos investimentos produtivos e reduzirá o grau de incerteza, permitindo uma redução dos níveis das taxas de juros. A médio prazo, uma desvalorização mais acentuada do real reduz a inflação, como aconteceu na Inglaterra e na Itália.
Um pouco menos de paixão e mais pragmatismo por parte da equipe econômica e do ministro Malan seriam benéficos ao real e ao Brasil e consolidariam o sucesso da equipe econômica.

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