São Paulo, sexta-feira, 27 de outubro de 1995
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Um imposto ambiental para gasolina e álcool

RONALDO SEROA DA MOTTA

Os automóveis particulares e os ônibus são as principais fontes de poluentes atmosféricos nas grandes cidades brasileiras. Entretanto, a emissão por pessoa transportada no transporte de massa é muito menor do que a gerada no transporte individual.
Os níveis de emissão dos carros novos a álcool e a gasolina são hoje equivalentes na maioria dos poluentes. Ou seja, no caso do transporte individual, a redução da sua contribuição à poluição do ar não se restringe, assim, a uma opção de combustível, conforme alguns querem crer.
A realidade reflete uma questão distributiva: é a poluição da riqueza e não da pobreza.
Os efeitos negativos dessa situação não se limitam à qualidade do ar. O congestionamento do tráfego aumenta o tempo de locomoção, principalmente dos mais pobres, que habitam áreas afastadas do centro urbano, gerando também ineficiência energética, reduzindo o tempo disponível das pessoas e afetando o bem-estar e a produtividade do trabalho.
A alteração do perfil dos serviços de transporte coletivo para alternativas com menor impacto na qualidade do ar (metrovias, por exemplo) possibilitaria um transporte urbano menos agressivo ao meio ambiente, além de oferecer menor tempo de locomoção e maior conforto. Adicionalmente, os mais ricos teriam alternativas para reduzir seu uso de transporte individual.
Um estudo recente da Coordenação de Estudos do Meio Ambiente do Ipea confirma que os casos de óbitos por doenças respiratórias estão fortemente associados a esse tipo de poluição.
Os resultados indicaram, por exemplo, que a redução do nível de concentração de particulados inaláveis na cidade de São Paulo para o nível do padrão mínimo legal resultaria na redução em mais de 6% dos casos de óbitos registrados por doenças respiratórias.
Com isso, seriam evitados custos anuais hospitalares com internações da ordem de R$ 800 mil. Vale mencionar que esses valores não refletem os custos ambulatoriais de tratamento dessas doenças e tampouco a perda de bem-estar das pessoas afetadas.
Nesse estudo, observou-se também que os impactos na saúde afetavam tanto pobres como ricos. Embora o pobre gere menos poluição, acaba sofrendo igualmente com seus efeitos nocivos.
Essa realidade sugere que as medidas de controle da poluição do ar devem ser dirigidas ao transporte individual e, ao mesmo tempo, à melhoria do transporte coletivo. Mas como fazer isso?
O Proconve (Programa de Controle da Poluição do Ar dos Veículos Automotores) já obteve resultados excepcionais na redução do nível de emissões dos veículos novos, e os programas de inspeção e manutenção de veículos, como o que se está implantando em São Paulo, poderão garantir esses resultados.
Agora, é preciso agir no sentido de reduzir o uso de automóveis e financiar o transporte coletivo. Uma opção é a criação de um imposto sobre a gasolina e o álcool.
Esse imposto, além de afetar menos os mais pobres, geraria receitas que seriam canalizadas para o fomento de alternativas de transporte urbano mais limpas e eficientes.
Outro estudo do Ipea revela que um aumento de 50% nos preços atuais desses combustíveis em São Paulo reduziria seu consumo em 20% e, consequentemente, a intensidade de uso de automóveis em magnitude equivalente.
Ou seja, com esse imposto seria possível uma redução de poluição próxima à pretendida pelo recente rodízio. Além disso, uma receita de aproximadamente R$ 500 milhões, somente nesta cidade, seria colocada à disposição para investimentos em transporte urbano.
Vale, todavia, esclarecer que esse imposto não seria aplicado em todo o território nacional e sim, por questões óbvias, somente nos centros urbanos onde o problema de poluição atmosférica existe.
O nível do imposto variaria também com o grau de severidade da poluição. Em cidades com concentrações menores de poluentes na atmosfera, um imposto menos elevado seria mais justo e eficiente. O objetivo é restringir os poluidores que estão gerando custos para a população como um todo. Os efeitos inflacionários não seriam generalizados. Além do mais, esse imposto refletiria o grau de qualidade ambiental e não uma expectativa inflacionária.
O Congresso determinou a extinção do IVVC (Imposto sobre Vendas a Varejo de Combustíveis) em 1996. A reforma tributária anunciada pode ser a oportunidade de reintroduzir um novo IVVC ambiental, que fomente o transporte coletivo e aumente a qualidade de vida urbana. Para tal, será preciso coragem e determinação para taxar os poluidores, de forma a financiar o bem-estar social.
Certamente, esse seria um imposto progressivo, e a população, informada dos seus benefícios, poderá apoiar essa iniciativa.

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