São Paulo, sábado, 28 de outubro de 1995
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Cidade de SP 'adota' cadeia pública

KENNEDY ALENCAR
ENVIADO ESPECIAL A BRAGANÇA PAULISTA

Administrada em parceria com a comunidade desde maio de 94, a Cadeia Pública de Bragança Paulista (80 km de SP) tornou-se um exemplo de que é possível resolver o problema penitenciário. Com R$ 39 mil, a prisão foi reformada e ganhou um anexo de 230m². Em 93, ocorreram sete tentativas de fuga. Desde que foi assumida pela comunidade, não houve nenhuma.
A Apac (Associação de Proteção e Assistência Carcerária), formada por moradores de Bragança, auxilia o juiz e o delegado responsáveis pela cadeia.
Um dos idealizadores do projeto, o juiz Nagashi Furukawa, diz que não houve milagre, mas dinheiro bem gasto e participação da comunidade. Ele ressalta que a associação não tem fins lucrativos.
“A comunidade entendeu que seria melhor para ela que os presos tivessem condições de vida dignas”, afirma. Segundo ele, toda a reforma da cadeia foi feita com doações. Todo o trabalho com os presos é feito por voluntários.
O anexo é usado como local de trabalho durante o dia e sala de aula à noite. Voluntária, a professora Lara Sago alfabetiza 30 presos.
Empresas da região enviam material para que os presos possam trabalhar. Atualmente, são feitos porta-gelos, brinquedos de plástico, pequenos transistores, cestas para jornal, capas de caderno e faixas médicas de gaze.
Segundo a lei, para cada três dias de trabalho é descontado um dia na pena. Os presos ganham em média um salário mínimo por mês. A família recebe 75%. A Apac fica com os 25% e usa o dinheiro na manutenção do presídio.
Walter Donizete Vasconcelos, 33, condenado a 15 anos por roubo, transformou-se numa espécie de gerente do trabalho dos presos. Elogiado pelo juiz por bom comportamento,Walter diz que só pensa em cumprir sua pena e arrumar um trabalho.
Vasconcelos já esteve em outras cadeias. “Não há comparação com essa, aqui não tem cheiro de cadeia”, diz. Além dos 52 presos que trabalham no anexo, oito detentos fazem a limpeza das celas e do pátio. Os outros esperam uma vaga para trabalhar porque não há lugar para todos.
Os critérios de escolha para trabalho são: 1º) presos condenados em regime semi-aberto; 2º) condenados em regime fechado com penas menores; 3º) condenados em regime fechado com penas maiores; e 4º) detentos provisórios.
Na reforma das celas, foram construídos 124 beliches de alvenaria. Com capacidade inicial para 60, a cadeia atende 150 presos. Quem não tem cama dorme no chão em colchões.

Arrependido
José Flávio de Lima, 28, condenadoa cinco anos e quatro meses por assalto a mão armada, fugiu da cadeia e, arrependido, telefonou querendo voltar.
Lima afirma que voltou pela família: “Vi que não tinha jeito, precisava pagar os anos que devia, mas disse para o delegado que só voltaria se fosse para cá. Se fosse para outra cadeia, não iria”.
Vasconcelos conta a história de outro preso que tentou pular o muro para fugir e acabou sendo capturado pelos próprios colegas. “Não queremos que nada prejudique o trabalho da Apac, porque no final é a gente que dança”, diz.

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