São Paulo, sábado, 28 de outubro de 1995
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Marco Tullio Giordana reabre caso Pasolini

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

"Pasolini - Um Crime Italiano" é um vitorioso filme com causa, mas seu triunfo é jurídico e não cinematográfico. O diretor Marco Tullio Giordana, responsável por um dos episódios de "Sempre aos Domingos" (1991), adapta aqui seu livro homônimo. Objetivo: reabrir o caso do assassinato de Pier Paolo Pasolini (1922-1975), que completa duas décadas na próxima semana, em 2 de novembro.
Giordana venceu: durante o lançamento de seu filme no último festival de Veneza, a justiça italiana anunciou a reabertura do processo, baseada em novos elementos e numa nova testemunha, um ex-policial que afinal decidiu falar. A tese em discussão é que o crime "homossexual", cometido pelo garoto de programas Pino Pellozi, condenado por dez anos e ainda preso por outras sentenças, teria sido na verdade um crime coletivo, talvez político, com a participação de outras pessoas.
Giordana poderia ter batizado seu filme de "PPP", de tal forma sua argumentação remete à apresentada por Oliver Stone no muito mais poderoso "JFK". Há um crime, um primeiro responsável óbvio, muitas dúvidas e um quixotesco investigador da verdade. O cineasta italiano, contudo, não vai tão longe quanto o americano na prestidigitação cinematográfica para demolir a tese oficial e apresentar sua própria.
Por um lado, Giordana não renuncia à reconstituição docuficcional de uma hipótese sobre o assassinato, embaralhando fato e ficção. Por outro, recusa-se ao sensacionalismo, por exemplo, de explorar as fotos reais de Pasolini massacrado, lembrando-o respeitosamente em rápidas imagens de documentários.
Crítico perspicaz da influência conservadora da TV sobre o cinema italiano contemporâneo, Giordana involuntariamente a reproduz, apesar de seu filme, bancado pelo poderoso grupo Cecchi Gori, só ter atraído a RAI (a TV estatal da Itália) às vésperas da estréia.
"Pasolini" é essencialmente um comportado telefilme, centrado na pesquisa de indícios e na apresentação deles no tribunal que condenou Pellozi e que reconheceu a possível existência de comparsas, logo esquecidos pela justiça e pela história oficial.
Tudo se passa como se o conformismo fílmico fosse aqui uma concessão da estética à política, uma estratégia de convencimento. Mas a forma acaba desnatando o conteúdo. Intenções nobres não garantem grandes filmes. Neste "Pasolini", em resumo, há pouco Pasolini.

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