São Paulo, quarta-feira, 1 de novembro de 1995
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Justiça serve aos fazendeiros, diz sem-terra

DA REPORTAGEM LOCAL

A Justiça funciona a mando dos fazendeiros e o governo é quem perde com as prisões dos sem-terra.
É dessa forma que, presa, Diolinda Alves de Souza, 25, uma das líderes dos sem-terra no Pontal do Paranapanema (extremo oeste de São Paulo), avalia o atual momento da crise no campo.
Em entrevista coletiva na Penitenciária Feminina do Carandiru (zona norte de São Paulo), diz que se considera "presa política" e acusa os fazendeiros de pagarem a Justiça para decretar prisões "ilegais".

Pergunta - Como você encara a sua prisão?
Diolinda Alves de Souza - Foi uma prisão ilegal, uma prisão política. Não é a forma de resolver a questão da reforma agrária.
Pergunta - As prisões podem inibir o movimento sem terra?
Diolinda - Nunca inibiram. Vão continuar as ocupações e os plantios no Pontal. As prisões trazem desgaste para quem governa o país hoje e traz mais desgaste para quem está ganhando dinheiro para decretar a prisão de lideranças.
Os trabalhadores vão se manter firmes. Eles estão revoltados. Não há risco de descontrole, mas se acontecer alguma coisa, a responsabilidade é das autoridades.
Pergunta - E as acusações de que há extremistas de esquerda agindo nas invasões?
Diolinda - O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) nunca pegou gente alheia à luta. É um movimento sério e honesto, e nunca, como dizem, organizou quadrilha e bandos. Tentam desmoralizar os sem-terra.
Pergunta - Essa situação não afeta o diálogo com o governo?
Diolina - Nunca tivemos problemas de diálogo com o governo federal. Não vai ser agora, com prisões e companheiros coordenando o movimento na clandestinidade, que o diálogo vai acabar.
Pergunta - O MST não radicaliza ao falar de invasões quando o governo fala em negociar?
Diolinda - O Graziano (Francisco Graziano, presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) tem sido sensível nas conversas com o MST. Mas nós não queremos só conversa. Queremos coisas concretas, assentamentos.
Pergunta - Reforma agrária não sai da noite para o dia?
Diolinda - É desculpa do governo dizer que as ocupações atrapalham a negociação. Nunca houve reforma agrária sem mobilização.
Pergunta - Não há risco de confronto a qualquer momento, com os líderes presos e os fazendeiros contratando seguranças?
Diolinda - Isso é o que tentamos evitar. Mas os fazendeiros sempre estão armados. Não é a primeira vez que eles dizem contratar seguranças para defender a propriedade. Mas qual propriedade, se as terras são do Estado?
Pergunta - Você está sendo bem-tratada no Carandiru?
Diolinda - Sim. Existe um grupo de presas que está transmitindo confiança. Espero sair logo.
Pergunta - Se você tivesse ficado presa no Pontal, os sem-terra tentariam resgatá-la?
Diolinda - Não tenho dúvida. Por isso, estou aqui. Mas errado é mandar prender pessoas inocentes.

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