São Paulo, quinta-feira, 2 de novembro de 1995
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Tradição e falências fazem cenário de SP

Cemitério da Consolação demonstra arte da ostentação

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Assim como o Père-Lachaise de Paris, o cemitério da Consolação, em São Paulo, também foi rejeitado pelos habitantes da cidade em seu início e, com os anos, acabou por aprisionar grande parte da história e da cultura do Estado.
Fruto de uma campanha de higienização iniciada no final do século 18, o cemitério foi planejado para afastar os cidadãos de São Paulo dos "ventos dominantes e impuros", como afirmavam as atas que instituíam sua criação.
Em um primeiro momento, todos acreditavam que a Consolação era longe demais do resto da cidade. O que resultaria em um grande transtorno para quem quisesse visitar seus mortos.
Mas, para o governo do período, essa era uma medida urgente. Uma epidemia de varíola avançava. Sua inauguração aconteceu com vítimas da doença, duas semanas antes da data oficial: 10 de julho de 1858.
Aos poucos, o que era medida necessária se transformou em uma ostentação de poder. Um passeio pelas ruas do cemitério é um encontro com todas as mudanças sofridas por São Paulo.
É possível então, em apenas poucos metros, assistir à falência da famílias tradicionais, a mudança de poder entre os imigrantes que chegavam ao Estado e os resquícios de um passado colonial.
E é desse passado um dos túmulos mais visitados: o de Domitila de Castro, a marquesa de Santos. Durante décadas, a mais famosa amante do imperador Dom Pedro 1º se tornou uma espécie de madrinha dos amores infelizes.
O lugar é também de onde se vê os restos da República velha, simbolizados nos monumentos aos ex-presidentes Prudente de Morais e Campos Sales.
Ao lado de Campos Sales, outro símbolo do fim da tradição: o mausoléu da família Matarazzo, o maior e mais imponente do cemitério, dedicado àqueles que, durante décadas, representaram a nova força industrial.
Uma força capaz de encomendar uma escultura de Victor Brecheret, que possui uma obra no cemitério, para homenagear seus mortos. Ou, ainda, como a família Sinischalchi, desmontar um mausoléu de mármore na itália e remontá-lo na Consolação.
Mas é lá também o lugar onde gerações de intelectuais se confundem, como o crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes, perto demais dos Matarazzo e distante do escritor Mário de Andrade, de quem teria mais afinidades.
Mário, aliás, pode ser encontrado quase ao lado de um desafeto: o também escritor Monteiro Lobato.

CEMITÉRIO DA CONSOLAÇÃO: r. da Consolação, 1.660, zona central, tel. 256-5919. Funciona de segunda a domingo das 7h às 18h.

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