São Paulo, domingo, 5 de novembro de 1995
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O mito da "reforma agrária"

MARCOS CINTRA

O bispo D. Luciano Mendes de Almeida buscou justificar, em sua coluna nesta Folha (28/10), o porquê da reforma agrária. A argumentação foi pouco convincente.
O termo "reforma agrária" denota uma solução muito específica para a questão fundiária, ou seja, a desapropriação de propriedades para distribuição entre os sem-terra. Essa visão está impregnada do romantismo que marcou a discussão sobre o tema nos anos 50.
Naquele tempo, partia-se de três pressupostos básicos na defesa da reforma agrária. O de que a terra é "herança divina"; o de que "small is beautiful"; e o da ligação atávica do homem pela vida no campo.
A terra era considerada um "bem não-produzido pelo homem", um patrimônio comum da humanidade. Sua apropriação privada só seria justificada se fosse distribuída de forma equitativa entre os que nela quisessem habitar e produzir.
É óbvio que a terra em seu estado natural é improdutiva. Ela precisa ser beneficiada pelo homem para tornar-se produtiva. Assim, justifica-se sua apropriação privada.
A segunda hipótese era a de que as propriedades familiares eram mais produtivas que as de maior porte. Há evidências de que os principais produtos agrícolas são produzidos de forma mais eficiente pelas propriedades de porte médio e grande.
Finalmente, os defensores da reforma agrária romântica acreditavam ser possível reverter a urbanização e "fixar o homem no campo". Mas a urbanização é uma tendência universal.
Não há divergência quanto à necessidade de ação contra o uso improdutivo da terra. Nisso, o desejo de D. Luciano coincide com o moderno liberalismo. Mas há divergência quanto às políticas para a obtenção dessa meta.
O instrumento correto deve ser a pesada tributação das glebas improdutivas e a oferta de crédito de longo prazo para a aquisição de terra, insumos e equipamentos.
A mera distribuição de terra pode ser um belo gesto cristão. Mas não resolverá o problema dos sem-terra; não garantirá oferta abundante de produtos agrícolas; e nem fará o homem moderno voltar ao campo.

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