São Paulo, segunda-feira, 6 de novembro de 1995
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BNDES quer estimular fusão e aquisição industrial

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O novo presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Luiz Carlos Mendonça de Barros, acredita que o processo de modernização do setor privado vai cortar empregos. Mas, sem isso, o país perderia "todos os empregos".
Segundo ele, será uma das prioridades do banco financiar o processo de fusões e aquisições, para que a indústria possa competir no mercado internacional e local.
Mendonça de Barros assume hoje, às 16 horas, a presidência do BNDES. A seguir, os principais trechos de entrevista exclusiva:

Folha - Por que o sr. trocou a posição de banqueiro pela de presidente do BNDES?
Luiz Carlos Mendonça de Barros - Em primeiro lugar, eu acredito neste governo. Além disso, faz sentido, com a minha formação profissional, fazer parte do BNDES. Isso realmente contou. Se fosse para outra área, eu talvez não tivesse aceito.
Folha - Não há uma incompatibilidade ética entre as funções que o sr. exercia e as que vai passar a exercer?
Mendonça de Barros - Sou um banqueiro aposentado. Eu não pretendo mais voltar, o que elimina o eventual conflito de interesses. Eu vendi as ações para os controladores do Banco Matrix. O contrato foi assinado no dia 31 de outubro e aprovado pelo BC no dia 1º de novembro.
Folha - Quais as áreas de atuação prioritária do BNDES?
Mendonça de Barros - Nos próximos quatro anos, os focos de atuação serão: 1) financiar a reciclagem do setor produtivo, que está transitando de uma economia fechada para uma economia aberta e; 2) ser o agente financeiro da reestruturação patrimonial e operacional do setor público. Nesse sentido, uma das rotas já traçadas é o Plano Nacional de Desestatização (PND). O BNDES pode, e há aí uma novidade, aproveitando a tecnologia desenvolvida, auxiliar os Estados e os municípios a executar seus processos de reestruturação. O BNDES estará disposto a, desde que o Estado esteja se reformulando, patrocinar um novo ciclo de investimentos em áreas sociais.
Folha - A privatização não está lenta?
Mendonça de Barros - A privatização de empresas produtoras de bens, como foi o caso do aço e das petroquímicas, é um processo mais fácil. O grande nó está nas empresas prestadoras de serviços públicos, como é o caso da energia elétrica, da telefonia. São setores monopolistas (uma empresa controla todo o mercado). Essa passagem de um monopólio público para um monopólio privado pressupõe um grande esforço regulador. Como o Estado exercia operacionalmente o monopólio, nunca se preocupou em estabelecer regras que buscassem eficiência.
Folha - Mas não é possível substituir o monopólio pela concorrência?
Mendonça de Barros - É possível criar competição em segmentos específicos, como o de linhas internacionais. Mas não é possível, por um problema de escala, imaginar ter três redes telefônicas disputando um mesmo segmento do mercado.
Folha - A Vale do Rio Doce é uma produtora de bens.
Mendonça de Barros - Há uma complexidade. Será a maior empresa em processo de privatização no mundo, da ordem de US$ 14 bilhões. Houve uma licitação e uma série de consultorias vão, junto com o BNDES, procurar a melhor forma de fazer isso, a forma mais rentável para o Estado. O Congresso quer participar disso. Para mim, o mais importante é discutir o que se vai fazer com o dinheiro da venda.
Folha - E o que se deve fazer? Pagar a dívida interna ou fazer investimentos sociais?
Mendonça de Barros - Acho que as duas coisas podem ser feitas.
Folha - Como se encaixa a idéia da criação do fundo de privatizações?
Mendonça de Barros - O Estado possuiu um volume de ativos (empresas etc.) muito grande e uma dívida interna que paga juros muito elevados. Basicamente o que se propõe é ter um novo tipo de dívida, um papel que estará garantido por essas empresas e que, por isso, pagará juros mais baixos.
Folha - A nova tributação nas Bolsas não atrapalha?
Mendonça de Barros - A proposta do deputado Kandir (Antonio Kandir, do PSDB-SP) resolve esse problema, ao isentar as aplicações de mais de 180 dias. São recursos de longo prazo e não de giro rápido na Bolsa.
Folha - Qual é a situação atual do BNDES?
Mendonça de Barros - O patrimônio do BNDES é maior do que o do Banco Interamericano de Desenvolvimento e metade do Banco Mundial. Os empréstimos do banco têm espaço para crescer. Faltavam projetos. Mas, agora, com a economia aberta e a necessidade do setor privado de investir para competir, isso vai mudar.
Folha - Qual será o modelo para os empréstimos?
Mendonça de Barros - A Fundição Tupy comprou os setores de fundição da Ford e da Mercedez, para ganhar escala, e procurou sócios para se capitalizar e investir em tecnologia. É um bom exemplo. O BNDES quer funcionar como o catalisador de processos semelhantes de fusões ou aquisições. Queremos ser acionistas das novas unidades.
Folha - Por que ter ações?
Mendonça de Barros - É uma forma de o banco participar dos ganhos dos processos bem-sucedidos.
Folha - Financiar fusões em bancos ou em todo setor privado não é o mesmo que financiar o desemprego?
Mendonça de Barros - Esse processo de reorganização preserva uma determinada quantidade de empregos, mas em um nível mais baixo do que é hoje. Mas, se você não fizer nada, o país vai perder todos os empregos.
Folha - Como se encaixam nesse modelo as pequenas e médias empresas?
Mendonça de Barros - A indústria brasileira vai ter de, agora, competir nos mercados externo e interno. Para isso, terá que atingir níveis mínimos de tecnologia, o que exige unidades de produção de tamanho grande e uma massa de pequenas e médias empresas gravitando em volta, que são mais dinâmicas. O BNDES vai financiá-las. A idéia é diversificar ao máximo esses empréstimos, já que a taxa de mortalidade nesse segmento é grande.

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