São Paulo, segunda-feira, 6 de novembro de 1995
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Rabin teve vida contraditória

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

O próprio Yitzhak Rabin ressaltou, no seu momento de maior glória, a contradição de um consumado militar como ele ter sido o mais importante agente do processo de paz no Oriente Médio.
"A assinatura da declaração de princípios israelense-palestino...não é fácil para mim, como um soldado de Israel", disse ele em setembro de 1994, nos jardins da Casa Branca, ao lado de Iasser Arafat.
Rabin virou um "um mártir da paz", como o classificou o presidente Bill Clinton, mas dos 13 aos 66 anos sua vida foi dedicada à guerra.
Ele nasceu em Jerusalém em 1º de março de 1922. Seu pai era um alfaiate imigrante da Ucrânia que virou líder sindical em Israel. A mãe, uma russa politizada de classe média, foi a principal influência da sua vida.
Aos 13 anos, ainda estudante numa escola agrícola, Rabin começou a receber treinamento militar sob o comando de Yigal Allon, futuro comandante israelense na Guerra da Independência, em 1948.
Ele lutou contra o Eixo na Segunda Guerra Mundial, contra os ingleses, que o mantiveram seis meses preso em 1946, e contra os árabes em 1948, quando forçou 50 mil deles a abandonar suas casas.
Em 1964, se tornou chefe do Estado-Maior das Forças Armadas de Israel. Foi o grande herói nacional na Guerra dos Seis Dias, em 1967, aclamado como o arquiteto da vitória militar contra Egito, Jordânia e Síria.
Foi na Guerra dos Seis Dias que Israel anexou os territórios da Cisjordânia e Gaza, que este ano passaram a ter administração palestina graças aos acordos assinados por Rabin e Arafat.
A seu pedido, foi indicado em 1968 embaixador em Washington, onde tratou de fortalecer mais as Forças Armadas de seu país, por meio de maciças compras de armamentos.
Ao retornar a Israel, em 1973, começou a carreira política, no Partido Trabalhista. Quando a primeira-ministra Golda Meir renunciou no ano seguinte, Rabin, que era seu ministro do Trabalho, a substituiu.
Foi a pessoa mais jovem (52 anos) e a primeira nascida na Palestina a chegar ao poder em Israel.
Seu primeiro governo não foi dos mais marcantes, exceto por alguns episódios simbólicos.
Entre eles, a sensacional operação militar no aeroporto de Entebbe, Uganda, em 1977, para libertar reféns a bordo de um avião da Air France sequestrado por terroristas árabes.
Meses depois de Entebbe, Rabin foi obrigado a renunciar quando um jornal israelense revelou que ele havia desrespeitado uma lei em vigor no país naquela época.
Rabin e sua mulher mantiveram uma conta bancária nos EUA depois de terem voltado a Israel.
A princípio, ele tentou negar as evidências, o que apenas complicou sua situação.
Em 1984, num governo de coalizão com o Likud, Rabin foi nomeado ministro da Defesa. Nessa condição, teve de lidar com a "intifada", a insurreição palestina nos territórios ocupados.
Foi dele a idéia de mandar quebrar os ossos das mãos de palestinos condenados por atirarem pedras contra soldados israelenses.
Essa política custou a Rabin a condenação da opinião pública internacional.
Mas foi ela que viabilizou seu retorno ao poder em Israel em 1992. Rabin reafirmou-se como liderança confiável tanto para a direita quanto para a esquerda em seu país.
Ao reassumir o governo, Rabin convidou seu adversário histórico no Partido Trabalhista, Shimon Peres, para ser ministro das Relações Exteriores e resolveu apoiá-lo em seu projeto de paz para o Oriente Médio.
Suas razões, ao contrário das de Peres, não eram idealísticas, mas pragmáticas. Israel não tinha mais condições políticas de manter 1,7 milhão de palestinos como subcidadãos em territórios sob seu controle.
Uma vez engajado no processo de pacificação, Rabin se mostrou tão obstinado em chegar ao seu fim como havia sido na busca de vitórias militares para seu país.
Yitzhak Rabin fumava quatro maços de cigarros por dia e gostava de beber, às vezes em grandes quantidades.
Era considerado homem taciturno, reservado, arrogante, que não se incomodava em tratar mal pessoas que desprezasse.
O reconhecimento mundial que recebeu devido a seu papel no processo de paz parecia estar liberando suas emoções.
Seus discursos ganharam tons poéticos. No sábado, conseguiu até cantar em público uma canção popular.
Rabin, 73, tinha um filho, Yuval, uma filha, Dalia, e três netos. Era casado desde 1948 com Leah Schlossberg.

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