São Paulo, quinta-feira, 9 de novembro de 1995
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Migração é responsável por queda e ascensão

ROGÉRIO C. DE CERQUEIRA LEITE

o Conselho Editorial
O economista John Kenneth Galbraith, 87, propôs recentemente uma hipótese, ou quase uma teoria, segundo a qual a migração é saudável tanto para o recipiente do migrante quanto para o cedente.
Sua convicção é de que emigram os mais empreendedores, os insatisfeitos, os pioneiros. Os que ficam são conformados. Ganha o país que recebe o imigrante, mas também ganha o país que cede, pois a população remanescente ficará com os meios disponíveis por habitante ampliados. Essa teoria admite uma antítese.
São expelidos os mais fracos, que não conseguem competir. Ficam os vitoriosos, dominantes, mais adaptados, mais capazes portanto. Migra o derrotado.
Quem teria razão? Galbraith ou eu? Somente a experiência poderia decidir. Olhemos para os EUA, formados por ingleses, irlandeses, escoceses, principalmente. Canadense, Galbraith deve ter olhado principalmente para esse exemplo.
E daí não restaria dúvida que sua teoria seria a correta. Mas e o Brasil? Se tomarmos como referência a emigração ibérica, talvez nos inclinássemos a aceitar a teoria de Galbraith.
Embora tenhamos uma contribuição ao patrimônio genético de cerca de 50% de herança africana, esse exemplo não pode ser levado em consideração pois é uma migração forçada.
Menos relevante é ainda nos EUA, onde não passa de 7% ou 8% do patrimônio genético (ver, por exemplo, "Atlas of Population History", R. Mc Evedy and Richard Jones, Penguin, 75).
Mas, se nos concentrarmos nas migrações deste século, algumas dúvidas talvez pudessem ser levantadas. Talvez o melhor teste para a proposta de Galbraith seja a Sicília.
A maciça imigração grega para a Sicília começou por volta de 750 a.C. e estendeu-se até 600 a.C., encontrando na região uma diversidade de povoados em graus diversos de desenvolvimento. Simultaneamente, os gregos também se instalaram na região sudoeste da península italiana.
A despeito da resistência de algumas cidades cartaginesas localizadas a oeste da ilha, a integração com os habitantes sicilianos originais, com exceção da cidade de Siracusa, foi pacífica. Todas as premissas para um teste da teoria de Galbraith estão asseguradas.
E, de fato, o surto de progresso foi enorme como atestam os inúmeros monumentos gregos conservados até hoje nas cidades de Siracusa, Agrigento, Selimunte etc.
Em realidade, antes dos gregos, já por volta do século 13 a.C., os sículas emigram para a Sicília derrotando os sicanos, oriundos das tribos originais que habitavam a Sicília desde o paleolítico inferior.
As cidades gregas instaladas a partir do século 6º a.C. rivalizam com suas próprias matrizes na Grécia e se opõem à poderosa Cartago e ao próprio Hanibal.
Essas guerras enfraquecem as cidades gregas da Sicília, que finalmente se rendem à Roma emergente no século 33 a.C. Os cartagineses são então expulsos e Roma estende seu absoluto domínio sobre a Sicília até o século 5º d.C.
Roma domina, mas não coloniza. São poucos os legados romanos, o anfiteatro de Siracusa, a "Piazzea Armerina" de Gela. Um corolário da teoria de Galbraith talvez pudesse aqui ser inferido; colonização sem emigração não traz progresso.

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