São Paulo, segunda-feira, 13 de novembro de 1995
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'Jovens proclamaram República'

LUIZ ANTÔNIO RYFF
DA REPORTAGEM LOCAL

Na semana em que se comemora a proclamação da República, um livro põe em dúvida a liderança do movimento que acabou com a monarquia em 15 de novembro em 1889.
Segundo "Os Militares e a República", os dois principais líderes da conspiração, Deodoro da Fonseca e Benjamin Constant, não eram republicanos, pelo menos até as vésperas do golpe.
Para o antropólogo Celso Castro, 32, autor do livro, o golpe foi dado por uma parcela reduzida do Exército, e o principal responsável pelo movimento foi um grupo de jovens oficiais da Academia Militar, conhecido na época como "mocidade militar".
Desse grupo faziam parte Euclides da Cunha, que mais tarde escreveria "Os Sertões"; Cândido Rondon, que ficaria conhecido pelo trabalho indigenista; Serzedelo Corrêa, futuro governador do Paraná; e Lauro Mller, que seria governador de Santa Catarina.
"Esse grupo conseguiu atrair Benjamin Constant, que é geralmente considerado o líder dessa conspiração, e se unir a Deodoro da Fonseca e a um pequeno grupo de oficiais com outro perfil", afirma Castro.
A tese revisionista surgiu de extensa pesquisa. A relação de fontes inclui os arquivos pessoais de Benjamin Constant, cartas e escritos de época dos alunos da Escola Militar, jornais e até o diário da filha de Benjamin Constant.
O livro mostra que Benjamin Constant, na época um professor de matemática da Escola Militar, foi atraído para a conspiração e a radicalização política por seus alunos.
"Havia muita coisa em comum entre eles, como a valorização da ascensão pessoal por mérito, a crença em doutrinas cientificistas, um ressentimento em não pertencer à elite social da época", diz Castro.
Para ele, Deodoro era "um chefe militar levado ao confronto com o governo por questões de defesa da honra do Exército e por especificidades da política do Rio Grande do Sul, não por convicções republicanas".
O livro traz como exemplo carta escrita a um sobrinho por Deodoro em 1888: "República no Brasil é coisa impossível, porque será verdadeira desgraça. (...) Os brasileiros estão e estarão muito mal-educados para 'republicanos'. O único sustentáculo do nosso Brasil é a monarquia; se mal com ela, pior sem ela".
Dez anos antes, contudo, os alunos da escola já haviam fundado um grupo republicano secreto.
Uma da preocupações de Castro foi traçar um perfil social da "mocidade militar".
"A grande maioria vinha do que se poderia chamar de Norte na época, acima do Rio de Janeiro, na parte menos desenvolvida do Império. Tinham entre 20 e 30 anos. Muitos não participavam de forma alguma da elite política, social ou econômica."
Além disso, valorizavam a ascensão por mérito individual, e as doutrinas cientificistas eram muito disseminadas entre os alunos.
Influenciados pelo positivismo, os jovens estavam mais afinados com o cientificismo.
"Eram pouco voltados para a carreira militar e acreditavam que a República era o regime político científico", constatou.
Filho de coronel reformado, Castro é um dos poucos pesquisadores que se dedicam ao tema. Foi co-autor de uma série sobre a memória do golpe de 1964, baseada em entrevistas com militares: "Visões do Golpe", "Os Anos de Chumbo", "A Volta Aos Quartéis".

Livro: Os Militares e a República - um Estudo sobre Cultura e Ação Política
Autor: Celso Castro
Lançamento: Ed. Jorge Zahar
Quanto: R$ 16

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