São Paulo, segunda-feira, 13 de novembro de 1995
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A consciência do homem e a preservação do meio ambiente

ANDREAS ATTILA DE WOLINSK MIKLÓS

O panorama atual do meio ambiente mostra que as sociedades atuais deixam muito a desejar em termos de organização do espaço, tão evidentes são os testemunhos da degradação. Constata-se um número crescente de fontes poluidoras advindas de atividades industriais, comerciais, de aterros e lixões, de atividades agroindustriais e agrícolas. Tais atividades geram os mais variados resíduos poluentes gasosos, líquidos e sólidos.
Estamos, pois, diante de um processo tecnológico incapaz de satisfazer as necessidades humanas sem degradar ou poluir; processo que gera consequências nefastas ao ambiente e coloca a vida do homem em perigo.
Cabe, portanto, uma análise do que está por detrás desse tipo de processo tecnológico: um sistema de desenvolvimento, bem como impulsos humanos -que estão ainda mais a montante-, nos três pólos da sociedade: o econômico, o político-jurídico e o cultural.
Ao se observar as inter-relações entre tais pólos, pode-se constatar que o pólo econômico se sobrepõe desmesuradamente aos demais. Chega, até mesmo, a ditar certas regras da trama social; por exemplo, quando as necessidades humanas são induzidas ou criadas, em grande parte, pelo marketing, sob a égide da necessidade de geração de lucro. O pólo econômico acaba impondo um modo de vida ao ser humano.
Tal concepção de sistema de desenvolvimento é, em si, "subdesenvolvida". As evidências são as consequências que acabam por gerar: a deterioração do comportamento humano e a degradação da natureza.
Numa sociedade sadia, o pólo cultural deve se sobrepor aos pólos político-jurídico e econômico. O espírito humano solidário, comunitário, fraterno e justo deve nortear a trama social.
Ocorre, entretanto, o inverso. Há uma falha na organização da sociedade. Quando nos confrontamos com o pensamento dominante na camada intelectual de nossa sociedade -qual seja, que para assegurar a vida deve-se ter como meta a manutenção do Homo sapiens como espécie dominante e prioritária na definição da ecologia-, percebemos impulsos culturais antagônicos àqueles cujos povos dizem: "O que ocorrer com a terra, recairá sobre os filhos da terra. Há uma ligação em tudo. Onde estão as árvores, os pássaros? Desapareceram. É o final da vida e o início da sobrevivência". Prioritária e dominante deve ser a vida.
As empresas, que consomem o capital ecológico do planeta, ao tentar reorganizar seus quadros, integrando programas de gestão da qualidade e do meio ambiente, visam a todo custo uma certificação ambiental. Entretanto, tais preocupações com o ambiente decorrem, ainda, apenas do interesse econômico, das vantagens comerciais que trazem as certificações. Raríssimas são as atitudes empresariais de equacionamento de suas atividades em prol do desenvolvimento sadio e harmônico do ser humano.
Nas universidades de agronomia e nos institutos de pesquisa, as resistências impostas aos novos modelos de desenvolvimento agrícola (ecológico, orgânico, biodinâmico etc.) geraram um atraso tecnológico no setor de algumas décadas. Tais resistências sempre estão relacionadas, em última análise, à insegurança do ser humano.
As preocupações com o ambiente, inseridas em pautas atuais, advêm, em grande parte, do modismo, das facilidades momentâneas de financiar projetos, de interesses comerciais. Elas são, portanto, deturpadas na maioria dos casos, pois não têm relação com uma consciência profunda de causa e efeito, com uma postura filosófica altruísta. O egoísmo ainda norteia as atividades humanas.
Por outro lado, também percebemos atividades permeadas de boas intenções, mas que, muitas vezes, necessitam de um conhecimento mais profundo dos ciclos da natureza, ou ainda de uma atitude moral a partir da qual o ser humano reconhece na natureza uma parte de si.
Essa atitude desabrocha no ser humano somente quando trabalhada a partir de todo um processo cultural. Raras escolas permeiam suas crianças com os impulsos da natureza. Elas terão dificuldade em reconhecer na natureza o essencial para o bem-estar da humanidade. Pensarão que o processo tecnológico tal qual não tem mais retrocesso e que a ciência sempre trará soluções ambientais remediadoras.
É o caso do fim da vida e do início da sobrevivência. A crise do homem é moral, ética, cultural. As demais crises (econômica, política, ambiental) vêm em consequência.

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