São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 1995
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Socióloga analisa modelos de 'escola democrática' em dissertação

FERNANDO ROSSETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O mundo tem, atualmente, pouco mais de 95 escolas totalmente democráticas -onde não há exigência de presença em aulas nem de notas e os alunos decidem as regras em assembléias.
O dado foi levantado pela socióloga Helena Singer, 27, em seu mestrado na Universidade de São Paulo, "Repúblicas de Crianças: Uma Investigação sobre Experiências Escolares de Resistência".
O caso mais conhecido de uma escola assim é a britânica Summerhill, criada pelo educador Alexander Neill em 1921 numa fazenda em Suffolk, na Inglaterra, onde funciona até hoje.
Na tese, Singer descreve os quatro casos mais conhecidos de escolas "democráticas", com destaque para Summerhill.
A primeira de que se tem notícia foi fundada pelo escritor russo Leon Tolstoi e levou o nome da cidade onde se instalou -Yasnaia-Poliana.
Embora até hoje sirva de exemplo na área, a escola só durou três anos (1857-1860), pois foi considerada "socialista" pelo czar.
A segunda experiência desse tipo, um lar de crianças, teve final trágico. Fundada por Janusz Korczak em 1912, sucumbiu nas mãos dos nazistas. Todos, crianças e Korczak, foram mortos.
"Hoje há associações por todo o mundo que levam o nome de Korczak, inclusive no Brasil", conta Singer.
A última escola destacada pela dissertação é a norte-americana Sudbury Valley School (costa oeste dos EUA), fundada no agitado ano de 1968. Hoje, a escola divulga seus ideais pela Internet (rede mundial de computadores).
Esses exemplos são contados para fundamentar a discussão teórica que Singer desenvolve na tese, debatendo as idéias dos franceses Emile Durkheim (1858-1917) e Michel Foucault (1926-1984).
"Essas escolas se diferenciam de todas as outras escolas, que poderiam ser colocadas no registro da educação moral de Durkheim", afirma.
Para Durkheim, a moralização ocorre através da disciplina, imposta por uma autoridade, como o professor. O que as escolas ditas "democráticas" fazem é derrubar essa noção de disciplina.
"Nelas há disciplina, só que sancionada pela coletividade", diz a socióloga.
Nesse caso, haveria uma "resistência à aplicação da disciplina como sujeição" -noção tirada da obra de Foucault. "É uma reivindicação de autonomia sobre a própria subjetividade."
As pessoas que passam por essas escolas dizem que se sentem mais disciplinadas e responsável. "Elas não precisam que ninguém fique mandando nelas", afirma Singer.
A conclusão é que, apesar de serem experiências de resistência -à disciplina nos termos foulcaultianos-, elas acabaram isoladas, sem influência no debate pedagógico. "Podem até resistir, mas produzir mudança é difícil."
(FR)

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