São Paulo, quarta-feira, 15 de novembro de 1995
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Ciclo eleitoral

DEMIAN FIOCCA

O governo Fernando Henrique pode reinaugurar no Brasil o que na literatura já foi definido como ciclo eleitoral. Freia-se a economia logo depois das eleições, para conter a inflação e ganhar credibilidade no mercado. Estimula-se o crescimento quando os pleitos se aproximam, de modo a reduzir o desemprego e obter maior apoio da população.
Esse tipo de adequação da política econômica ao calendário das votações chega por vezes a receber o tratamento de estudo científico. Tratar-se-ia de administrar a permanência no poder do melhor modo possível, dentro das limitações impostas pela realidade.
Mas ele também mostra, evidentemente, a existência de interesses distintos. E sugere alguma incoerência ou oportunismo na atitude de governantes em face dos preceitos por eles defendidos. Afinal, além de eleger-se ou manter-se no governo, pode-se esperar que pelo menos algumas forças políticas tenham convicções e compromissos a defender.
Os mais conservadores, liberais em economia, explicam as políticas expansionistas e os diferentes tipos de intervenção no mercado que com frequência antecedem as eleições como prova da demagogia e ignorância dos políticos. Sociais-democratas, em sentido inverso, identificam nisso a prova de que as políticas liberais não atendem à maioria da população.
Enquanto uns acham que tudo vai bem até que as eleições desvirtuem a condução da economia, outros dizem que a proximidade do escrutínio popular força os políticos conservadores a abandonar a defesa de interesses minoritários e a contradizer dogmas econômicos supostamente errados.
É inegável, de qualquer modo, que toda política geral afeta de modo diverso os vários interesses particulares. Por isso, nem sempre a avaliação predominante da política econômica acompanha o que de fato está ocorrendo. E aqui chegamos ao presente no Brasil. A desaceleração do ritmo de crescimento mostra-se hoje mais intensa do que o esperado há alguns meses. E, no entanto, as críticas a tal fenômeno são menores.
É compreensível, por exemplo, que os ganhos financeiros obtidos por grandes indústrias que nos últimos meses trouxeram recursos para o país contribuam para arrefecer as críticas do setor às elevadíssimas taxas de juros. Como o aumento do desemprego enfraquece os sindicatos, estes reduzem as reivindicações justamente quando a situação é pior para os trabalhadores.
Sejam mais ou menos relevantes essas explicações, o fato é que há hoje um certo descompasso entre a rapidez na queda do ritmo de crescimento e o "clima" econômico retratado nos meios de comunicação. Comparando sempre com o mesmo período do ano anterior, a economia brasileira vinha crescendo 10,1% no primeiro trimestre de 95. Cresceu 5,5% no segundo trimestre e apenas 0,9% nos meses de julho a setembro, comparados com igual período de 94. Esses são os últimos dados do IBGE.
Técnicos do próprio instituto chegaram a projetar um crescimento médio de apenas 4% em 1995. Trata-se de uma média composta de "boom" no início do ano e estagnação ou mesmo queda absoluta da atividade no final. Antes da posse do presidente, membros da chamada equipe econômica previam crescimento de 7% ao ano durante seu mandato. Há poucos meses o governo projetava, satisfeito, algo entre 5% e 6% em 95.
Pode estar em curso uma onda conformista com a idéia de que o Brasil entre em 1996 num ritmo quase estagnado. E de que as taxas de juros seguirão altas para atrair capital. Pode ser a versão nacional do ciclo eleitoral. Crescimento seria um problema para 1997, 1998.

Hoje, excepcionalmente, deixamos de publicar a coluna de ANDRÉ LAHÓZ

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