São Paulo, quinta-feira, 23 de novembro de 1995
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Pierre Verger foge da 'dignidade burguesa'

SILVIO CIOFFI
DA REDAÇÃO

Pierre Fatumbi Verger, o fotógrafo que descobriu a África baiana, diz que começou a viajar para fugir da "dignidade burguesa".
Nascido Pierre Edouard Léopold Verger, em 1902, esse parisiense de olhos cor-de-mormaço, que colocou o pé na estrada aos 30 anos, chegou a Salvador em 1946.
Com um baú de lata e uma câmera Rolleiflex pendurada no pescoço, já tinha passado pela ex-URSS e Polinésia.
Tinha também feito fotos para o jornal "Paris Soir" nos EUA, China, Indochina, Japão, Laos, Camboja, Filipinas e na África.
E é a conexão cultural entre a África e o Brasil que marca sua obra de fotógrafo e de etnólogo doutorado pela Sorbonne de Paris, em 1966, sem nunca ter frequentado aquela universidade.
Autor do livro "Fluxo e Refluxo do Tráfico de Escravos entre o Golfo do Benin e a Bahia de Todos os Santos nos Séculos 17 a 19", Verger percebeu que, de lado a lado, havia uma troca de influências entre africanos e brasileiros.
Estudou então a Revolta dos Malés, ocorrida em 1835, levante fracassado que resultou na deportação de negros livres que viviam no Brasil.
Descobriu que esses negros seguidores do Islã ou adeptos dos orixás levaram, com o seu retorno para a África, algumas festas católicas, modos de vestir, de comer e até de construir.
Babalaô
Em suas pesquisas Verger conheceu reis das nações iorubas (onde hoje fica a Nigéria), sendo em 1950 sagrado babalaô, ou sacerdote de Ifá, adotando o nome Fatumbi -aquele que renasceu da graça de Ifá.
Aos 93 anos, Pierre Fatumbi Verger diz que remoçou no candomblé e que "renasceu", literalmente, quando virou babalaô.
Verger, que Jorge Amado chama de o mais baiano dos baianos e que desembarcou no Brasil no imediato pós-Guerra depois de ter lido alguns dos livros do escritor, nasceu num dos bairros mais chiques de Paris, o 16e, no início do século, e hoje vive numa casinha de dois cômodos na ladeira da vila América, em Salvador.
Autor, com outro "baiano-estrangeiro", o pintor Carybé (leia biografia na pág. 6-15), de "Lendas Africanas dos Orixás", Verger virou ele mesmo um personagem mítico da Bahia.
Suas fotos e escritos são ferramentas importantes para o conhecimento da cultura mestiça afro-brasileira.
Ele, que não era feliz em sua vida confortável e que partiu em busca de aventura e conhecimento, encontrou o paraíso na Terra em Salvador, a "Cidade da Bahia".
Suas imagens de festas populares, de candomblé, procissões, de igrejas, praças e sobradões estão guardadas na Fundação Pierre Verger, que funciona no Pelourinho, e registraram para sempre a alma baiana num exaustivo trabalho de documentação.
(SC)

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