São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Barros de Castro defende a desvalorização

FRANCISCO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO

O economista Antonio Barros de Castro, ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), acha que o momento é oportuno para se corrigir o câmbio.
Castro diz que o balanço de pagamentos está sob controle apenas no aspecto de caixa. Para ele, o país não está pronto para crescer porque faltam ajustes importantes.
Segundo Castro, o câmbio defasado está estimulando as empresas a importar equipamentos em excesso, forçando um processo de automação exagerado que induz ao desemprego. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Folha - O governo está com um diagnóstico errado da conjuntura econômica?
Antonio Barros de Castro - Sim e não. Ele está convencido de que, a partir da metade do ano, reassumiu o controle da inflação e do balanço de pagamentos. E, de fato, isso ocorreu. A olho nu, não se vê problemas no que se refere ao balanço de pagamentos, sobretudo pelo critério de caixa. Certamente, uma análise mais fina detecta facilmente graves problemas. Outra área em que há problema é na presumida retomada do crescimento.
No que toca ao balanço de pagamentos, o que se percebe é que o desempenho das nossas exportações é fraquíssimo. Elas estão crescendo em valor a um ritmo de aproximadamente 7% ao ano.
Não há, contudo, aumento das quantidades transacionadas. No mundo, o volume de transações deve elevar-se 9% este ano. Em valor, as exportações de Argentina, Chile e México cresceram de 30% a 40% no primeiro semestre.
Nas importações, quem está em retração são matérias-primas e bens intermediários, ressalvado o caso muito particular dos automóveis. O que está freando as importações é a queda do nível de atividade industrial.
Folha - Qual é o problema para a retomada do crescimento?
Castro - Poucos se deram conta de que o governo trocou de freio. A taxa de câmbio vem sendo corrigida em termos nominais. Quem segurou as pressões inflacionárias que se manifestaram de março a agosto foi a retração do nível de atividade.
Folha - Quais os efeitos desse freio no setor industrial?
Castro - No discurso oficial muitas vezes parece que as atividades que apresentam dificuldades são localizadas e essas exceções estão situadas onde os empresários não se prepararam para a abertura.
O exame dos dados nega essa proposição. Mostram que, com exceção única da indústria de produtos alimentícios, todos os setores industriais passaram por verdadeiro colapso do nível de atividade entre o final de 94 e agosto de 95.
Folha - Essas subidas e descidas podem deixar sequelas?
Castro - Neste momento, os equipamentos estão baratíssimos por causa do câmbio e da taxa de juros baixa no exterior. Se você mantém o câmbio nessa altura, está empurrando no sentido de eliminar compra doméstica. Você está induzindo a sobrecomprar equipamentos e a comprar equipamentos tão poupadores de mão-de-obra quanto possível. Você atinge fortemente o emprego.
Folha - O Brasil então estaria estimulando um processo de modernização além da capacidade do seu mercado de trabalho de absorver?
Castro - É isso mesmo. A reestruturação das empresas é um processo complexo que deve avançar muito mais rápido no plano organizacional e das mudanças da política em relação ao trabalho do que em equipamentos.
Folha - Mas, ao retomar as intervenções no câmbio, o governo já não está cuidando disso?
Castro - Não, isso é nominal. É indexação. Isso tem que ficar bem claro. Ele vai ter que corrigir o câmbio em termos reais.
Eu diria que do ponto de vista do momento, talvez estejamos nele. O nível de atividade está muito baixo e não há pressões de demanda muito sérias. Além disso, a reforma fiscal não se fará amanhã. Hoje, dada a grande quantidade de reservas, o governo tem condições em alguma medida de aguentar o tranco inflacionário resultante de uma desvalorização.
Folha - Então, a âncora cambial não é mais a base do Real?
Castro - Não. Nem na concepção, basta ver o livro do Gustavo Franco ("O Plano Real e Outros Ensaios"), nem na prática. Nos últimos meses, o câmbio tem sido discretamente alterado, em sintonia com os preços, sendo o país obrigado a tragar grandes quantidades de capital para impedir que uma nova e desastrosa valorização cambial venha a ocorrer. Falta agora admitir que mesmo a taxa que aí está não representa equilíbrio algum e está, sobre valorizada.

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