São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Ajax deveria ensinar como jogar futebol

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Depois do baile que o seu time levou do Ajax, pela Copa dos Campeões da Europa, no meio da semana, a estrela do Real Madrid, Raúl, sucumbiu maravilhado: "O time deles é magnífico e deveria ensinar futebol aos jovens nas escolas".
É verdade. Assistir a um jogo do Ajax é como fazer um curso intensivo de futebol, pois, em 90 minutos, desfilam diante de seus olhos os cem anos de evolução desse esporte, em cenas vertiginosas, como num documentário montado em um caleidoscópio.
Basta observar a disposição de seus jogadores em campo: um goleiro, claro, dois zagueiros, três médios e cinco avantes, como na formação clássica 2-3-5, que antecedeu ao WM. Sim, porque o central Blind começa sempre como o antigo beque de espera, enquanto seu parceiro, Frank de Boer, faz o beque de avanço, aquele que dá o primeiro combate. Com uma diferença fundamental: tanto Blind quanto de Boer tratam a bola com tal finura que poderiam ser ambos dois meias, funções, aliás, que exercem com igual desenvoltura e muita frequência. Estamos ainda nas duas primeiras décadas do século e lá está a linha média bem definida -Reiziger, Ronald de Boer e Bogarde-, apoiando o ataque formado por Finidi George, Davids, Kluivert, Litmanen e Overmars.
Bola rolando, dependendo de seus caprichosos itinerários, o Ajax veste um claro WM, com seus dois zagueiros recebendo o apoio mais constante de Reiziger, pela direita, ou de Bogarde, pela esquerda, enquanto Ronald de Boer, pela direita, e Davids, pela esquerda, passam a atuar como verdadeiros volantes, apoiadores. Daí é um passo para a diagonal de Flávio Costa, só que com dois apoiadores, enquanto Litmanen volta para armar as jogadas de ataque.
E assim vai o Ajax variando seu sistema do 4-2-4, para o 4-3-3 ou o mais recente 3-4-3. Com um detalhe: jamais os pontas Finidi e Overmars largam suas posições junto à linha lateral, a não ser para se aprofundarem em uma jogada de contragolpe, pelas meias correspondentes. Assim como Kluivert limita-se a um movimento vertical pelo meio, seja para atacar ou para recuar a fim de participar do combate ou para ajudar na armação.
A bem da verdade, parece que seu técnico, Van Gaal, dividiu o campo, no sentido vertical, de gol a gol, e estabeleceu faixas definidas a serem ocupadas por cada um dos seus jogadores. Embora esse esquema possa dar a impressão de facilitar a marcação adversária, o time do Ajax atua como um suporte emocional aos jogadores. Cada um preocupado apenas em atuar na sua determinada faixa, o toque de primeira acentua a velocidade da bola e a precisão do passe. Isso, somado ao altíssimo nível técnico de todos os jogadores (incluo aqui o goleiro Van der Sar, que joga com a facilidade de um líbero) e a gana de atacar sempre, faz do Ajax não só o melhor time do mundo. Mas uma verdadeira lição do que o futebol já foi. E que poderá ainda vir a ser.

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